terça-feira, fevereiro 24, 2009

Índia, um "player" instável no mercado de açúcar

A Índia, o país queridinho da vez da mídia brasileira, tem um papel fundamental sobre o mercado do açúcar, visto que sua alternância entre altos e baixos volumes de produção impactam diretamente o mercado internacional.

Como exemplo disso, temos duas notícias publicadas pela Gazeta Mercantil na semana passada sobre o tema:

ÍNDIA DEVE IMPORTAR VOLUME RECORDE DE ETANOL DO BRASIL

A Índia, que com sua superprodução em 2007/08 derrubou o mercado de açúcar mundial, começou em dezembro passado a fechar alguns contratos de importação de açúcar do Brasil e, agora em fevereiro negocia também a compra de etanol. A estimativa é de que o país, que possui mistura facultativa de etanol à gasolina, compre entre 300 milhões e 500 milhões de litros neste ano. Os valores negociados estão atrativos, inclusive, maiores do que os do mercado americano.

Tarcilo Rodrigues, da Bioagência, explica que a exportação de álcool hidratado para a Índia para embarque a partir de maio está resultando em remuneração de R$ 745 por metro cúbico (m3) na usina. Esse valor é de R$ 700 quando a negociação é com o mercado americano. "Com um custo de produção de R$ 740, as usinas não têm interesse neste momento em fechar negócios para os EUA. Para Índia e Europa ainda é interessante, pois estão remunerando acima do custo", explica. O mercado interno está pagando valores entre R$ 920 e R$ 940.

A necessidade de importação indiana se deve ao fato de que, com a queda de 30% na produção de açúcar, o país terá também menor produção de melaço, usado na produção do biocombustível. A última compra de etanol brasileiro significativa feita pela Índia foi em 2006, quando cerca de 300 milhões de litros foram importados, conforme recorda Rodrigues (Gazeta Mercantil, 18/02/09)

Índia pode voltar à superprodução em 2011

Cada um dos 1,1 bilhão de indianos toma por dia de três a quatro xícaras de chá, com muito açúcar. Festivais de doces ocorrem em todo país e a variação da renda é diretamente proporcional ao consumo de sobremesas e industrializados. Mas essa atração dos indianos pelo açúcar é, de alguma forma, para o Brasil motivo de preocupação. A cada dois anos, a gigante Índia pode simplesmente inverter o mercado mundial de açúcar o que significa às usinas brasileiras, maiores produtoras mundiais da commodity, resultados extremos, que vão de prejuízos a lucros vultuosos. "Sim. É totalmente possível que a Índia aumente de 20 milhões para 30 milhões de toneladas sua produção de açúcar já em 2011", afirmou o indiano Rakesh Bhartia, CEO do maior grupo produtor de açúcar da Índia e da Ásia, o Bajaj Hindusthan.

Nesta safra, a Índia já reduziu sua produção de açúcar em 8 milhões de toneladas - de 26 milhões de toneladas para 18 milhões - e há previsões de que este número seja ainda maior e atinja 10 milhões de toneladas a menos, o equivalente a cerca de 37% da produção do Centro-Sul do Brasil. Essa mudança drástica aconteceu de um ano para o outro sobretudo porque os preços do açúcar estavam baixos. Além disso, o governo indiano reajustou para cima o valor de outros produtos, como o trigo e o algodão, para estimular o aumento de área dessas culturas e conter a necessidade de importação.

As usinas do país, que investiram para sair da capacidade de moagem de 137 mil toneladas diárias em 2005 para 367 mil em 2008, tiveram que moer menos. Na Índia, as indústrias são proibidas de ter canavial próprio. O fornecimento da matéria-prima é feito exclusivamente pelos 50 milhões de plantadores de cana, número equivalente à população dos nove estados do Nordeste brasileiro. "Também estamos pagando alto pela alavancagem financeira, resultado de termos investido mais do que o cultivo da cana poderia atender", lamenta.

Ele acredita que por mais cinco ou sete anos essa interferência governamental vai continuar sendo definitiva na disponibilidade de cana na Índia que, segundo ele, é um dos maiores entraves para novos investimentos. Há ainda a obrigatoriedade de as usinas terem de vender 10% de sua produção aos preços definidos pelo governo, que distribui o produto à população de menor renda. "Podemos negociar o restante do nosso produto livremente no mercado".

Apesar de reconhecer a possibilidade desastrosa (às usinas do Brasil) de a Índia produzir algo próximo de 30 milhões de toneladas de açúcar em 2011, Bhartia traz como alento grandes chances de não haver aumentos significativos em 2010, ano que ainda deve trazer bons ganhos às usinas brasileiras, que continuarão nesse intervalo sendo quase que, exclusivamente, o supridor mundial da commodity a preços atrativos. "A cana dos próximos dois anos já foi cultivada e, até 2010, isso não deve mudar de forma marcante".

Atualmente em torno de 22 milhões, o consumo de açúcar na Índia deve atingir 26 milhões de toneladas em 2012. Trata-se de tudo o que o Centro-Sul do Brasil produziu nesta safra, que finda em abril.

Bhartia aposta que com a saída da União Europeia do cenário exportador, o mercado mundial será dominado por Brasil e Índia. A estimativa do Rabobank, que convidou Bhartia para evento realizado ontem em São Paulo, é de que em 2010 a UE importe sozinha cerca de 4 milhões de toneladas.

A dúvida é saber em que proporção e a que tempo a Índia vai retornar ao mercado. O gigante asiático tem condições enormes de expandir somente com aumento de produtividade da cana e ganho de eficiência das cerca de 500 usinas já instaladas. Na média, elas moem 3,5 mil toneladas de cana por dia, mas as maiores já atingem volumes quatro vezes maior, entre 12 mil e 15 mil toneladas. "Muitas pertencem ao governo e não são tão eficientes como as privadas".

Outro indicador com grande espaço para evoluir é o de produtividade dos canaviais. Na média, é de 69 toneladas de cana por hectare, apesar de, em alguns estados, esse rendimento já chegar a 105 toneladas, próximo ao da região Centro-Sul do Brasil. "A cana é conhecida como cultura dos preguiçosos, porque não exige tratos culturais como os do arroz e do trigo. O lado bom é que sempre haverá produtor interessado neste cultivo". Com capacidade de moagem de 22 milhões de toneladas, o grupo Bajaj Hindusthan está entre os cinco maiores do mundo, atrás da brasileira Cosan, que tem condições de moer em torno de 40 milhões de toneladas de cana. Com 16 usinas, seis destilarias anexas e nove delas com co-geração de energia , o grupo tem diferencial de usar o bagaço da cana para produzir placas de madeira (MDF). "Conseguimos agregar mais valor com a MDF do que com co-geração de energia", diz o empresário. (Gazeta Mercantil, 19/02/09)

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