segunda-feira, setembro 29, 2008

Futebol e Agronegócio segundo Roberto Rodrigues

O ex-ministro Roberto Rodrigues publicou na sábado na Folha de São Paulo um artigo interessante mostrando a relação entre a Copa do Mundo de futebol no Brasil e o agronegócio:

COPA DO MUNDO E AGRICULTURA -ROBERTO RODRIGUES

O Brasil deverá sediar a Copa do Mundo de 2014, 64 anos depois da fatídica derrota para o Uruguai no Maracanã, mas ainda temos de provar para a Fifa nossa capacidade de organização.

Virão 32 seleções nacionais, fazendo 64 jogos em cerca de dez cidades.

Espera-se a visita de 750 mil a 800 mil estrangeiros. Na Copa de 2006, na Alemanha, mais de 3 milhões de pessoas foram aos estádios, cerca de 18 milhões de espectadores assistiram aos jogos em praças montadas para isso; e mais de 25 bilhões, em 240 países, viram os jogos pela TV.

A partida de abertura da Copa será jogada no estádio do Morumbi, que será reformado para isso.

As questões mais críticas são: estacionamento, acesso nos terminais aeroportuários e rodoferroviários, mobilidade urbana e regional, segurança, garantia de energia elétrica (a multa cobrada pelas emissoras de TV num eventual apagão é monumental) e assim por diante. Além de São Paulo, as cidades de Brasília, Belo Horizonte, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Recife e Salvador são prováveis sedes de jogos, e todos esses problemas têm de ser tratados já.

É um desafio portentoso, que, vencido, trará ao país grande visibilidade global e um enorme conjunto de oportunidades -seja do ponto de vista da construção civil (que terá muitas obras para realizar), seja no aperfeiçoamento de sistemas inteligentes de trânsito que permanecerão para o futuro, seja nos negócios de hospitalidades, seja na difusão das marcas nacionais de produtos em que somos líderes, como os biocombustíveis.

O agronegócio tem aí um papel formidável, que começa com o abastecimento de produtos agrícolas, onde os turistas encontrarão sabores, qualidades e variedades capazes de provocar uma demanda sustentada. Mas o espaço de promoção de nossos produtos é muito maior, nas transmissões dos jogos, nos outdoors dos estádios e ônibus, nas promoções dos restaurantes, nas exposições paralelas etc.

Durante a Copa da Alemanha, o nosso Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento realizou campanha de comunicação do agronegócio e promoção do alimento brasileiro, dividida em três conjuntos de ações: imagem, promoção e divulgação.

Foram divulgados os principais produtos da pauta exportadora brasileira de alimentos para o público local e internacional, abrangendo anúncios em revistas de bordo da Lufthansa, outdoors em aeroportos, anúncios em pilares de rua e placas de metrô nas cidades-sede dos jogos da Copa.

Foram realizadas degustações na Embaixada do Brasil, na Câmara de Comércio Brasil-Alemanha e nas áreas abertas pela "Copa da Cultura", organizada pelo Ministério da Cultura. Houve coletivas de imprensa, seminário sobre o agronegócio na Bolsa de Valores de Frankfurt e um encontro econômico e empresarial promovido pela Câmara de Comércio Brasil-Alemanha.

Essas ações abriram espaços importantes com parceiros e potenciais compradores.
A Copa de 2014 está ainda longe, mas precisamos nos preparar desde já com o planejamento estratégico para aproveitar bem as oportunidades.

Aliás, o futebol tem tudo a ver com o agronegócio: a bola é de couro, assim como as chuteiras; meias e uniformes são feitos de algodão ou seda; gramados são adubados e conduzidos agronomicamente; ingressos são de papel (feitos de árvores); todo mundo vai de carro, ônibus ou bicicleta equipados com pneus de borracha, e assim por diante.

(Roberto Rodrigues é coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal, foi ministro da Agricultura do governo Lula)

Apesar da crise, investimentos estrangeiros namoram etanol no Brasil

Em duas notícias disponíveis no site BrasilAgro (uma do site Relatório Reservado e outra da Agência Estado) podemos observar o interesse de multinacionais em nossa produção de açúcar e álcool:

ADM QUER COMPRAR DUAS USINAS PAULISTAS

A norte-americana ADM negocia a aquisição de duas usinas de álcool e açúcar no interior de São Paulo. (Relatório Reservado, 29/09/08)

GRUPO NOBLE QUER AMPLIAR INVESTIMENTOS NO BRASIL

A gigante do comércio mundial Noble Group, com sede em Hong Kong, está com seus radares voltados para o Brasil. Especializada em produzir e negociar commodities, a companhia quer transformar o País em sua quinta maior operação mundial.

Em todo o mundo, a Noble fatura mais de US$ 11 bilhões por ano. A empresa começou no Brasil como trading agrícola, exportando grãos. Hoje tem investimentos em logística, usinas de álcool e açúcar e mineração. Neste mês, o grupo deu mais um sinal do apetite pelo mercado brasileiro, ao iniciar a construção de um terminal no porto de Santos (SP), o primeiro da empresa no País.

O empreendimento de dezenas de milhões de dólares (o valor exato não foi revelado) irá escoar mais da metade da sua produção de grãos e açúcar para China, Oriente Médio e Europa, principalmente. "O Brasil é uma de nossas prioridades em investimentos", diz Ricardo Leiman, brasileiro que está à frente das operações do grupo em Hong Kong há cinco anos.

O anúncio no País é um sinal da confiança nos mercados emergentes, que têm recebido a maior parte da atenção da empresa nos últimos anos. Segundo Leiman, a crise financeira e a possibilidade de desaceleração da economia mundial ainda não preocupam o grupo. "Estamos focados hoje em países do Oriente Médio, Ásia e América Latina, onde a demanda doméstica vai continuar crescendo, mesmo que em um ritmo menor", diz Leiman.

Com capacidade para armazenar 90 mil toneladas de açúcar e 73 mil toneladas de grãos (soja ou milho), o terminal no porto de Santos entrará em operação em novembro de 2009. "Ele vai garantir mais eficiência que qualquer outro porto local. Com isso, nosso açúcar a granel será exportado com maior agilidade", afirma. O grupo entrou forte no setor de álcool e açúcar no ano passado. Comprou uma usina em Votuporanga (SP), onde quadruplicou a capacidade de produção, e iniciou a construção de outra em Meridiano (SP).

Até 2011, o objetivo é chegar a uma capacidade de processamento de 10 milhões de toneladas de cana-de-açúcar por ano. "Queremos estar entre os cinco ou dez maiores produtores nacionais de etanol em alguns anos."

Além do terminal em Santos, a companhia está erguendo um terminal líquido em Itaqui (MA), para escoar a matéria-prima. A região foi escolhida por estar mais próxima dos mercados visados pelo etanol que a empresa vai produzir: Estados Unidos e Europa.

O grupo começou a verticalizar as operações em todo o mundo há cinco anos. No Brasil, desde então, foram adquiridos e construídos cinco armazéns de estocagem de grãos. Também foram feitos investimentos em mineração - a compra de parte da mineradora Mhag, que explora e tem reservas de ferro no Nordeste - e em uma indústria de fertilizantes. Estima-se que os investimentos já realizados e em andamento no País cheguem a US$ 600 milhões - os executivos, porém, não confirmam os valores.

Além de reduzir custos, a atuação integrada e a compra de ativos fixos fizeram a empresa triplicar de tamanho no País. No ano passado, o faturamento da operação brasileira chegou a uma expansão de 60%.

Globalmente, a companhia cresceu 20%, com vendas de US$ 23,5 bilhões em 2007. Praticamente o mesmo valor (R$ 20 bilhões) foi atingido nos primeiros seis meses deste ano.

"Além de focar em commodities, onde o Brasil é bastante competitivo, investir em infra-estrutura também tornou-se prioridade", conta Leiman. Segundo ele, o processo industrial já responde por um terço da receita total da companhia.

"Vamos continuar crescendo organicamente e por meio de aquisições", diz. O executivo não descartou a compra da Agrenco, trading nacional que foi alvo de operação da Polícia Federal e teve seus principais executivos presos, em junho.

Na época, o grupo de Hong Kong fez uma proposta pela Agrenco, que também recebeu ofertas de outras multinacionais de commodities: Louis Dreyfus e Glencore. Leiman confirmou que a empresa analisa ativos no País, inclusive a Agrenco, que teve seu pedido de recuperação judicial aprovado na semana passada (Agência Estado, 28/09/08)

sexta-feira, setembro 26, 2008

Crise Americana - Analistas preveêm alguns problemas ao agronegócio brasileiro

Em duas notícias publicadas hoje na Folha de São Paulo temos análises das possíveis consequências da crise americana ao agronegócio brasileiro:

CRISE AMERICANA: REFLEXOS NO PIB DO AGRONEGÓCIO

A crise financeira internacional, iniciada nos EUA, vai ser marcante para o PIB do agronegócio brasileiro no próximo ano. Neste ano, praticamente não há efeito porque a produção já foi colhida e os preços tiveram relativa queda.

A avaliação é de Geraldo Sant'Ana Barros, coordenador científico do Cepea e professor titular da Esalq/USP. O setor vai ter problema de financiamento porque as empresas estão reduzindo sua exposição no Brasil.

Não tanto pela situação brasileira, mas mais pela falta de recursos.Barros diz que o Brasil vai continuar sendo o local de oportunidades para o agronegócio, mas haverá uma esfriada nos investimentos, por ora, principalmente na abertura de novas áreas.

Quando as coisas se acalmarem, os investimentos voltam porque é aqui que os investidores encontram as melhores condições de produção.

AGRONEGÓCIOS: RECURSOS DIFÍCEIS

Bruno Schauff, gerente regional do Rabobank, instituição que participa com R$ 4 bilhões no agronegócio brasileiro, diz que, com a crise, os recursos ficaram mais difíceis e o custo da captação deve subir um pouco.

O banco, no entanto, não parou as operações. Schauff participou ontem de evento no Cepea. Na visão do Rabobank, que sempre trabalha com perspectivas de longo prazo, o cenário do agronegócio brasileiro é bom, apesar dos já tradicionais problemas e desafios, como logística, capital caro, sistema legal ineficiente, estrutura fiscal pesada e complicada.

Um dos pontos positivos é que o mercado interno é grande e a renda real está crescendo.A crise financeira vai significar menos recursos para os produtores. Com isso, é hora de controle de gastos e freio em novos investimentos.

A avaliação é de Lucilio Alves, pesquisador e professor do Cepea. Para Alves, o produtor deve plantar com gestão adequada e investir no processo de comercialização. No cenário atual, as margens devem ser menores e, em algumas regiões, as contas podem não fechar.

terça-feira, setembro 23, 2008

Estrela lança Banco Imobiliário com plástico verde

Muito interessante a notícia abaixo que encontrei no site da UNICA. Tenho muita esperança que a alcoolquímica cresça muito e que tenhamos muitos plásticos provenientes do etanol no mercado no médio e longo prazo:

Brinquedo com plástico de etanol de cana exerce duplo papel educativo

A sustentabilidade é o foco central de uma edição limitada do popular jogo Banco Imobiliário, lançada recentemente pela Estrela em parceria com a Braskem. Além de embutir nas estratégias da brincadeira o tema da sustentabilidade social, ambiental e econômica, o Banco Imobiliário Sustentável tem como exclusividade utilizar peças plásticas derivadas de etanol de cana-de-açúcar. “Pensamos junto com a Estrela em um brinquedo que pudesse levar o conceito de ser renovável, para o público em geral”, afirma Luiz Nitschke, executivo da área de Polímeros Verdes da Braskem.

“O jogo trabalha o conceito da sustentabilidade por meio de regiões geográficas onde há produção de cana ou valorização ambiental, além de ter negócios com créditos de carbono”, explica Nitschke. “O objetivo é o de comunicar a iniciativa de sustentabilidade do polietileno verde por meio de um jogo educativo. As cartas do jogo oferecem, por exemplo, punições para quem joga lixo pela janela do carro ou não coloca filtro contra a poluição na chaminé da fábrica”.

Para o consultor de emissões e tecnologia da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA), Alfred Szwarc, a sustentabilidade não é mais uma opção, mas uma necessidade. “Por isso, jogos como este são muito bem-vindos, por serem instrumentos de educação muito positivos, não só para crianças e jovens, mas para adultos também”, concluiu Szwarc. “O fato de as peças serem de plástico verde e os demais componentes do jogo de papel reciclado faz com que as pessoas não apenas brinquem de sustentabilidade, mas lidem com ela”.

O polietileno de origem renovável está sendo produzido em fase experimental pela Braskem. Por isso, foram feitos apenas 10 mil exemplares do Banco Imobiliário Sustentável, vendido em lojas do Wal-Mart.A planta-piloto da Braskem produz atualmente mil quilos por mês do chamado polietileno verde, que tem como matéria-prima o etanol de cana-de-açúcar. Segundo o executivo da empresa, o plástico renovável está despertando interesse de empresas globais em áreas como as de alimentos, cosméticos, higiene e limpeza. Com isso, a meta para 2010 é produzir 200 mil toneladas de polietileno verde por ano, o que exigirá a utilização de 450 mil metros cúbicos de etanol a cada 12 meses, ou o equivalente a 450 milhões de litros.

Nitschke explica que o polietileno é o plástico mais consumido no mundo e, até agora, era produzido exclusivamente de fontes fósseis como petróleo ou gás natural. “São consumidos hoje 60 milhões de toneladas por ano de polietileno no mundo”, diz o executivo, acrescentando que para cada quilo gerado de plástico renovável evita-se a emissão de 2,5 quilos de CO2, da plantação da cana até a fabricação do polietileno verde. Além disso, o material pode ser reciclado: no Brasil, o percentual de reciclagem do plástico chega a 20%

domingo, setembro 21, 2008

FAO considera exemplares práticas de pecuária do Brasil

Nós sabemos de longa data que o Brasil é líder em tecnologia de agricultura tropical e pecuária, entretanto, quando a FAO reconhece publicamente o reconhecimento toma outra dimensão.

A reportagem abaixo foi encontrada na seção de Agronegócios do Cosmo:

Agropecuária brasileira é modelo, segundo FAO

Algumas práticas adotadas foram consideradas um exemplo de estratégia de pecuária associada ao desenvolvimento
Agência Brasil

Algumas práticas adotadas na agropecuária brasileira foram consideradas um exemplo de estratégia de pecuária associada ao desenvolvimento sustentável e recomendadas pela Comissão de Desenvolvimento da Pecuária para a América Latina e o Caribe (Codegalac), da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), capítulo Cone Sul., durante a sua 10ª reunião.

No encontro, que terminou hoje (19) e foi realizado em parceria com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), o principal alerta foi o crescimento de mais de 3,7% por ano da pecuária na região, relacionado à redução da área de florestas. De acordo com a Codegalac, 70% dos pastos hoje estão em processo de degradação.

Esse processo aumenta a vulnerabilidade às mudanças climáticas e à produção de gases de efeito estufa. Além disso, a Amazônia está entre os ecossistemas mais afetados com a expansão da agropecuária.

No entanto, os países do Cone Sul, maiores exportadores de carne no mundo, devem ter mais oportunidades no mercado mundial, já que a expectativa é que o consumo de carne seja duplicado nos próximos 20 anos.

Como os principais importadores de carne exigem cada vez mais que a produção ocorra em áreas ambientalmente sustentáveis, os governos devem desenvolver urgentemente mecanismos e políticas para conter o avanço para área vulneráveis, o que aumenta os níveis de desmatamento, degradação do solo, perda de biodiversidade e de recursos hídricos.

Os países devem contar com apoio da FAO para formular uma marco orientador para desenvolver políticas e programas de gestão agro-ambiental e inovação tecnológica, além da recuperação de áreas já degradadas pela agropecuária.

Vai ser criado um grupo de trabalho de centros de pesquisa da região, liderado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), para elaborar uma proposta de ação e avaliação técnica, econômica e ambiental das tecnologias disponíveis para recuperação das áreas degradadas e intensificação sustentável da produção pecuária.

quinta-feira, setembro 18, 2008

Uso da terra no Brasil, um texto para análise

No "Estado de São Paulo" de quarta-feira foi publicado um texto muito interessante sobre a utilização das terras agrícolas no Brasil

Uso da terra e produção agropecuária
André Meloni Nassar

Dos diversos temas ligados ao meio ambiente que vêm ganhando relevância na sociedade brasileira, o que mais atinge a produção agropecuária e silvícola é a questão do uso da terra. Mesmo no Brasil, país privilegiado em disponibilidade de terras para produção e conservação, não se pode negar que a terra é um recurso escasso. Essa parece ser a razão imediata que justifica por que a mudança do uso da terra, provocada pela expansão da produção agrícola e de florestas plantadas, passou a ser critério de avaliação de sustentabilidade de ambos os setores. A boa notícia é que há tempos o tema deixou de ser visto como tabu pelas diferentes cadeias produtivas.

O debate sobre uso da terra ganhou importância porque a agropecuária - englobando as áreas ocupadas com lavouras anuais, permanentes e pastagens - e a produção florestal são os setores produtivos que demandam os maiores volumes de terra no País. Na realidade, a agropecuária e as florestas plantadas ocupam, juntas, uma parcela do território brasileiro menor que a ocupada por formas não-produtivas de uso, como reservas indígenas e unidades de conservação. Partindo de um ponto de vista essencialmente ambiental, essas atividades produtivas respondem a fatores de mercado e, por isso, seguiriam na direção contrária da necessidade de conservar e preservar as florestas, a biodiversidade e a paisagem natural, que são formas de ocupação do solo de baixo custo de oportunidade. A conversão de paisagens naturais em produção agropecuária ou florestal - sem se preocupar ainda com que tipo de atividade é o carro-chefe do processo - é vista com importância ainda maior quando se trata do bioma Amazônia.

Mas não é apenas o tema da conversão de terras virgens em áreas produtivas que está em jogo. Por particularidades da legislação ambiental brasileira, os produtores agrícolas e de florestas carregam um não desprezível passivo de reserva legal e, ainda que de menor intensidade, de áreas de preservação permanente. Apesar dos inúmeros questionamentos jurídicos que pairam sobre o Código Florestal de 1965, emendado a última vez via medida provisória em 2001, a legislação ambiental traz ao produtor, proprietário ou possuidor da terra a obrigação de preservar.

No entanto, além das exigências impostas sobre as áreas já abertas, a expansão da produção sobre novas áreas também está sob crítica, seja porque desmatar se transformou em atividade não aceita no Brasil e no exterior, seja porque grande parte das áreas virgens se encontra resguardada na forma de unidades de conservação, reservas indígenas, etc. A defesa legítima de que o setor produtivo deve contribuir com sua parcela para a conservação, aliada a pressões não necessariamente defensáveis do ponto de vista legal contra a possibilidade de expansão das áreas produtivas, cria um ambiente não saudável de competição e disputa entre produção agropecuária e florestal e preservação ambiental.

As conexões entre uso da terra e produção agrícola e florestal se dão, dessa forma, em duas vertentes: 1) Com a contribuição da expansão da produção para o desmatamento, sobretudo nas regiões do bioma Amazônia; e 2) na necessidade de o setor produtivo zerar seu passivo ambiental recuperando, ou compensando, o que seria mais racional, áreas de preservação permanente e de reserva legal nas terras que já são usadas de forma produtiva. Enquanto a segunda abordagem tem caráter mais doméstico, porque se refere à legislação ambiental brasileira, a primeira é fortemente influenciada pelo ambiente internacional. Isso ocorre não somente porque a questão do desmatamento está umbilicalmente conectada com a emissão de gases do efeito estufa, mas porque o desmatamento tem sido usado externamente como argumento para tentar minar as indiscutíveis vantagens do etanol brasileiro feito de cana-de-açúcar ante seus concorrentes.

Dado que ainda não existem registros de que a expansão da produção de cana-de-açúcar provoque desmatamento, uma vez que a cultura cresce basicamente em áreas já ocupadas por pastos e lavouras, foi criado o conceito do efeito do uso indireto da terra. A necessidade de quantificação desse efeito indireto faz parte das legislações européia e norte-americana para biocombustíveis. A idéia do efeito indireto - e é preciso lembrar que ele não se aplica apenas ao caso do etanol brasileiro - diz que é preciso contabilizar no balanço de carbono a quantidade equivalente emitida pelo desmatamento causado indiretamente pela expansão da matéria-prima de base agrícola utilizada na produção do biocombustível. Para nós, brasileiros, essa discussão soa um pouco surreal. Por enquanto, até que alguma metodologia de cálculo seja desenvolvida e amplamente testada e aceita, ela realmente é.


Não há dúvida que o tema do uso da terra foi jogado nas costas dos setores agrícola e florestal como um passivo. No entanto, políticas que estimulem um equilíbrio aceitável entre produção e preservação ambiental podem alterar os sinais do resultado desta equação. Essas políticas passam pela busca de formas inovadoras de compensação das exigências de reserva legal que não inibam novos investimentos no setor agrícola e florestal. Isso é importante porque um país como o Brasil não se pode dar ao luxo de investir menos em produção de alimentos, etanol e produtos florestais. Passam também pelo estabelecimento de sistemas de zoneamento que garantam credibilidade e confiança, sobretudo fora do Brasil, em que a incorporação de novas terras para agropecuária e florestas plantadas se dará equilibrando as necessidades de produção e de conservação. E, por fim, pela criação de mecanismos que estimulem intensos ganhos de produtividade na pecuária, sobretudo nos pastos que são conversíveis para produção agrícola e silvícola, evitando, assim, que o crescimento futuro do rebanho se traduza em novos desmatamentos.

André Meloni Nassar é diretor-geral do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone). E-mail: amnassar@iconebrasil.org.br

quarta-feira, setembro 17, 2008

Aumentam as exportações brasileiras de leite em pó

No ano passado ocorreu um significativo aumento das exportações de leite em pó conforme podemos observar na notícia abaixo do Valor Econômico de hoje:

Brasil ganha força na disputa pelo mercado global de leite em pó

Até 2012, a capacidade de produção de leite em pó no país deverá crescer cerca de 40% e alcançar 700 mil toneladas por ano, segundo projeção da Serlac, trading responsável pela maior parte das exportações brasileiras do produto.

Atualmente, a capacidade instalada para fabricação de leite em pó é de aproximadamente 500 mil toneladas anuais, e o Brasil exporta o equivalente a 75 mil toneladas, de acordo com o presidente da Serlac, Alfredo de Goeye. Quando todos os novos projetos e ampliações estiverem finalizados, e a produção chegar a 700 mil toneladas, a expectativa é que as vendas externas atinjam quase 250 mil toneladas.

"Praticamente todo o excedente [de produção] vai ser destinado à exportação", afirma de Goeye. Conforme a Serlac, há oito novos projetos para produção de leite em pó no país, incluindo os de empresas estreantes e ampliações, como a que a Itambé faz em Uberlândia, onde dobra a capacidade de produção de sua fábrica. Outro exemplo é a goiana Laticínios Bela Vista que vai triplicar a sua produção de leite em pó, segundo o presidente da Serlac.

O quadro desenhado por de Goeye para a demanda pode parecer otimista considerando o atual momento do mercado, quando a oferta elevada de leite fluido derruba os preços e levanta dúvidas sobre a capacidade de escoar a produção. Mas o fato é que os investimentos miram o longo prazo - cerca de cinco anos - e, nesse horizonte, a perspectiva é de demanda externa crescente por leite em pó na África, América Latina e Ásia.

"A China é um desejo, e haverá agressividade brasileira na América Latina e na África", afirma o executivo. Hoje, a América Latina, com destaque para a Venezuela, e a África já são os principais clientes do Brasil. No cenário que de Goeye antevê, Nova Zelândia e Austrália, outros dois importantes players no mercado de lácteos, atenderiam a demanda do Oriente Médio e da Ásia.

O México, um dos maiores importadores mundiais de lácteos, ainda é uma incógnita para o Brasil, reconhece de Goeye. Apesar de as barreiras sanitárias terem sido superadas e de fábricas terem sido habilitadas a exportar, o leite em pó brasileiro paga uma tarifa de 60% para entrar no mercado mexicano. Já o produto dos EUA e de outros países com os quais o México tem acordo comercial paga tarifa zero.

Maurício Nogueira, analista da Scot Consultoria, concorda que o Brasil vai vender mais leite em pó para países da África no longo prazo. Mas também aposta em vendas para China e Índia. "São países que produzem muito também, mas onde a demanda cresce mais que a capacidade de produção", observa, referindo-se aos dois emergentes.

Números da agência da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), compilados pela Scot, corroboram as perspectivas de demanda crescente por leite em pó no mundo. Segundo dados da agência com projeções até 2017, no ano passado a produção global foi de 4,021 milhões de toneladas para um consumo de 3,810 milhões.

Neste ano, a produção projetada é de 4,069 milhões de toneladas, com demanda um pouco acima disso: 4,071 milhões. Nos próximos nove anos, oferta e consumo de leite em pó seguirão equilibrados, conforme as projeções da FAO, que estima produção de 4,897 milhões de toneladas em 2017, ano em que o consumo deve alcançar 4,899 milhões.

Independentemente da demanda externa, Nogueira avalia que os investimentos para ampliar a capacidade de produção de leite em pó são também importantes porque controlam as oscilações de preços do setor.

Além disso, investir na secagem do leite se tornou crucial por causa do crescimento acelerado da oferta do produto no Brasil. "Se não produzir leite em pó, [o mercado] terá que engolir leite", ironiza o analista.

Estimativas do segmento indicam que a produção nacional de leite pode alcançar 30 bilhões de litros este ano, após um volume de 27,2 bilhões de litros de 2007, segundo o IBGE. Isso se o crescimento de 9,38% verificado no primeiro trimestre deste ano no país, pelo instituto de estatísticas, for extrapolado para todo 2008. O motor desse aumento foram os preços altos - no mercado interno e no exterior no ano passado, segundo analistas.

As cotações internacionais já começam a perder fôlego. Mas é consenso que dificilmente voltarão aos patamares de 2006, quando a tonelada de leite em pó estava na casa dos US 2.000 na Europa. O último acompanhamento do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) indica preços entre US$ 3.500 e US$ 3.550. No mesmo período de 2007, a tonelada estava entre US$ 5.500 e US$ 5.700.

Cana-de-açúcar é a segunda fonte de energia do Brasil

Em nota publicada no site da UNICA encontramos a constatação de que a cana é a segunda fonte de energia mais importante no Brasil perdendo apenas do petróleo. Esperamos que no futuro esta posição seja conquistada pelo etanol:


Cana-de-açúcar: a segunda fonte primária de energia do Brasil

O estudo realizado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), do Ministério das Minas e Energia, confirmou que a cana-de-açúcar é a segunda fonte primária de energia do País. O Balanço Energético Nacional 2008, com base no ano de 2007, mostra que a cana representou 15,9% da Matriz Energética Brasileira, atrás apenas do petróleo, com 37,4%.


Entre as fontes renováveis, a cana-de-açúcar ocupa a liderança, tendo, em segundo lugar, as hidrelétricas, que representam 14,9% do total. O consultor de Bioeletricidade da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA), Carlos Roberto Silvestrin, afirma que a importância energética da cana-de-açúcar tende a crescer com a expansão da oferta de etanol e de bioeletricidade, cogerada pelas usinas.
“Além do uso do etanol como combustível, a bioeletricidade terá um importante crescimento daqui em diante”, argumentou Silvestrin, dizendo que a cana manterá o segundo lugar na matriz energética, pelo menos, nos próximos 10 anos.

Os dados do Balanço Energético Nacional mostram ainda que a oferta interna de energia no Brasil cresceu 5,6% em 2007, passando de 226,1 milhões de tep (tonelada equivalente de petróleo) em 2006 para 238,8 milhões de tep em 2007. O crescimento foi superior ao da economia no ano passado (5,4%, segundo o IBGE). A oferta de energia renovável teve um crescimento em relação a 2006 de 7,6%, enquanto o incremento na oferta de energia não-renovável foi de quase 4%.

Com isto, a participação das fontes renováveis na Matriz Energética passou a ser de 46%. De acordo com Silvestrin, as fontes renováveis tendem a ultrapassar o patamar de 50% nos próximos anos. “O Plano de Referência para 2030 prevê o crescimento das fontes renováveis, após a entrada regulamentada da energia de biomassa, na qual a cana desempenha importante e estratégico papel, em complementação com as novas hidrelétricas", disse o consultor da UNICA.

sábado, setembro 13, 2008

Meta de biocombustíveis da UE é reduzida

O Brasil, que torce pela transformação do etanol em commodity, pode estar sofrendo um revés muito forte, pois a UE reduziu sua meta de biocombustíveis.

Abaixo a notícia publicada ontem no Valor Econômico:

UE REDUZ META PARA USO DE BIOCOMBUSTÍVEL

Um comitê chave do Parlamento Europeu votou ontem pela redução drástica na meta de uso de biocombustíveis no transporte terrestre até 2020 na União Européia (UE), ameaçando o projeto brasileiro de transformar o etanol numa commodity global.

Os líderes dos 27 países-membros da UE tinham aprovado a meta de 10% de utilização de etanol e biodiesel, no ano passado, para combater as emissões de gases de efeito-estufa.

Ontem, o Comitê Industrial do Parlamento Europeu, que lidera o debate sobre clima e energia, alterou o enfoque sobre energia renovável, reduzindo o espaço para etanol e procurando introduzir eletricidade, ou uso de carro elétrico, por exemplo, como alternativas.

A votação fixou uma meta intermediária de 5% no uso de energia renovável até 2015 no transporte terrestre europeu. No total, 80% viriam de biocombustíveis de primeira geração, como é o caso do etanol brasileiro, e 20% de eletricidade (carro elétrico), hidrogênio renovável ou biocombustíveis de segunda geração.

Em 2020, seria alcançada a meta de 10%, dos quais 40% teriam que vir de eletricidade renovável e biocarburante de segunda geração, cortando significativamente o espaço para o etanol brasileiro e outros combustíveis derivados de produtos vegetais.

Essa votação foi importante, mas não é ainda a cartada final. O projeto que será submetido ao plenário dependerá de um acordo político entre o Parlamento, a Comissão Européia (o braço executivo da UE) e o conselho de representantes dos 27 Estados membros - e os três divergem.

O ponto que causa maior confronto entre o Parlamento e o Conselho Europeu, a instância mais poderosa do bloco, é sobre a redução da meta de uso de biocombustível de 10% para 6%. Alguns governos consideram que os deputados propõem algo irrealista, por ser pouco provável dispor de carro elétrico em grande escala em 2020, e biocombustível de segunda geração em quantidade suficiente. "Carro com hidrogênio, então, esquece", diz um analista em Bruxelas.

"As instituições européias têm dúvidas sobre biocarburante e por isso têm a proposta de revisão na meta em 2014 para ter melhor conhecimento científico", acrescenta ele.

A decisão de ontem do Comitê Industrial reflete a que ponto chegou a pressão da opinião pública européia, que transformou o etanol e o biodiesel em vilões, acusados de terem aumentado os custos dos alimentos, de gerarem pobreza e causarem desmatamento das florestas.

As Organizações Não- Governamentais (ONGs) a princípio ficaram a favor dos biocombustíveis, mas mudaram radicalmente sua posição com a crise alimentar. Adrian Bebb, da Amigos da Terra, disse em Bruxelas que o voto "reconhece os sérios problemas com o uso em grande escala de biocombustível. Usar produto agrícola para alimentar carro é uma falsa solução para combater mudança climática e poderia tornar irreversível a perda de espécies naturais e aumentar a miséria de milhões de pessoas".

Em meio a pressões inclusive para a União Européia abandonar a meta, o Comitê Industrial manteve, em todo caso, o compromisso político europeu pela meta de uso de etanol, num contexto em que está complicado ser a favor de biocombustíveis.

"Todo mundo gosta de energia renovável, mas biocombustível virou vilão, e os deputados [europeus] terão eleição no ano que vem", observa uma analista.

A votação não foi boa para o Brasil, porque se for confirmada compromete a criação de um mercado internacional para o etanol produzido no país.

Tampouco está definido o debate sobre uso de etanol produzido em terra degradada, com conceitos muito estritos provocando fortes divergências entre as instituições européias.

O setor privado brasileiro está tentando convencer os europeus a usar a definição de terra degradada da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). A França quer aprovar um projeto sobre a meta até dezembro, quando acaba sua presidência da EU (Valor, 12/09/08)

sexta-feira, setembro 12, 2008

Internacionalização da Friboi traz novos problemas

Quando uma empresa passa pelo processo de internacionalização, algo que a JBS Friboi está fazendo, com certeza tem que enfrentar problemas muito diferentes daqueles de seu país de origem.

A notícia abaixo do Valor Econômico de hoje mostra como aspectos culturais podem trazer sérios problemas para a produção:

Questão religiosa leva JBS a demitir 100 pessoas nos EUA
Ricardo Balthazar

O grupo brasileiro JBS demitiu nesta semana 100 trabalhadores muçulmanos que reivindicavam jornadas de trabalho mais flexíveis para conciliar suas obrigações religiosas com o serviço, em uma tentativa de liquidar uma disputa que durante vários dias agitou a principal planta de processamento de carne bovina do grupo nos Estados Unidos.

O problema surgiu no começo deste mês, quando os muçulmanos do mundo inteiro celebram o Ramadã. Neste período do ano, os fiéis devem ficar em jejum entre o nascer e o pôr-do-sol e só podem comer depois de uma oração que precisa ser feita durante o crepúsculo. Os horários estabelecidos pela JBS para os trabalhadores da fábrica do grupo em Greeley, no Estado do Colorado, tornam impossível o cumprimento dessas obrigações.

A planta opera com dois turnos de trabalho. O pessoal escalado para o segundo turno entra no começo da tarde e só volta para casa à noite, depois de mais de oito horas lá dentro. O contrato coletivo assinado pela JBS com o sindicato que representa os trabalhadores prevê três pausas para descanso e alimentação nesse período, duas de quinze minutos e uma de meia hora.

Depois de várias reuniões com o sindicato e representantes dos trabalhadores muçulmanos, a empresa concordou em antecipar a pausa de meia hora para alimentação durante o Ramadã, das 21h15 para as 20 horas. Mas não adiantou, porque nesta época do ano o sol se põe antes das 19h30 em Greeley e os muçulmanos precisam fazer suas orações antes disso se quiserem cumprir os rituais do Ramadã.

Na sexta-feira da semana passada, 220 trabalhadores abandonaram a linha de produção e saíram da fábrica em protesto contra a decisão da empresa. A JBS considerou a iniciativa uma violação do acordo coletivo e suspendeu os trabalhadores. Cerca de 120 voltaram ao trabalho na terça-feira. Os outros foram demitidos no dia seguinte.

Em comunicado distribuído na quarta-feira, a empresa disse que "trabalha junto com todos os empregados e seus representantes sindicais para acomodar práticas religiosas de forma razoável, segura e justa para todos os envolvidos". A JBS tem cerca de 3,4 mil funcionários em Greeley. Cada turno de trabalho na planta emprega 1,5 mil pessoas.

O conflito com os muçulmanos é uma amostra das dificuldades que o grupo brasileiro tem encontrado para recrutar e reter a mão-de-obra necessária para processar as milhares de cabeças de gado que são abatidas diariamente em suas fábricas. A JBS chegou aos Estados Unidos há pouco mais de um ano, quando adquiriu o controle da Swift, terceira empresa do setor de carne bovina no país.

Mais de dois terços dos empregados da JBS em Greeley são imigrantes de origem hispânica. Em 2006, antes da chegada do grupo brasileiro, a empresa perdeu 1,3 mil trabalhadores que viviam com documentos ilegais nos EUA e foram descobertos pelas autoridades. Nos últimos tempos a empresa contratou um grande número de trabalhadores africanos, refugiados de países pobres conflagrados por guerras civis e conflitos étnicos.

Cerca de 15% dos funcionários da empresa em Greeley são africanos, a maioria de religião muçulmana. Eles saíram de lugares como a Somália, a Etiópia e o Congo para viver nos Estados Unidos graças a programas da Organização das Nações Unidas (ONU) para refugiados políticos.
O trabalho em Greeley é desgastante, mas um operário recém-contratado ganha US$ 2,5 mil por mês, além do plano de saúde e de outros benefícios raríssimos na África.

A empresa diz que a agitação dos últimos dias não afetou sua produção. Mas ela certamente gerou muita publicidade negativa. Mais de uma centena de trabalhadores da JBS e líderes muçulmanos se reuniram numa praça no centro de Greeley para protestar contra a empresa na terça-feira. Eles deram entrevistas à imprensa local para se queixar de maus-tratos e discriminação e reclamar dos supervisores da fábrica, a maioria trabalhadores de origem hispânica.

quarta-feira, setembro 10, 2008

O que acontecerá com as commodities?

A notícia abaixo do Valor de hoje mostra como a crise imobiliária americana pode afetar o mercado de commodities.

Reposicionamento de capitais tira suporte de commodities agrícolas
Fernando Lopes


O reposicionamento de investimentos globais decorrente das medidas anunciadas no fim de semana pelo governo americano para socorrer as principais agências hipotecárias do país (Fannie Mae e Freddie Mac) aumentou o nervosismo nos mercados agrícolas.

Apesar de os chamados "fundamentos" das principais commodities da área ainda apontarem baixos estoques, riscos climáticos à produção e demanda em elevação no longo prazo, muitos analistas admitem a possibilidade de migração de capitais e novas quedas nos próximos dias, ainda que para um patamar bastante superior às médias históricas. Mas mesmo fortes altas de preços não estão descartadas.

O fato é que, desde que bancos centrais mundo afora começaram a elevar as taxas básicas de juros em resposta às turbulências internacionais, as commodities agrícolas perderam sustentação. Os especialistas mantêm-se cautelosos em relação ao que pode acontecer no curto prazo, mas, ao que tudo indica, as máximas de 2008 já ficaram mesmo para trás.

Na bolsa de Chicago, principal referência mundial para os preços dos grãos, a terça-feira foi tensa e de muitas oscilações. Soja, milho e trigo permaneceram em baixa durante a maior parte da sessão, mas ao fim dela apenas milho e trigo fecharam em queda. A soja, depois de descer ao menor patamar em cinco meses, recuperou-se e fechou em alta.

Impulsionados por notícias climáticas desfavoráveis às lavouras dos EUA, os contratos da soja com vencimento em novembro (que hoje ocupam a segunda posição de entrega na bolsa, normalmente a de maior liquidez) subiram 9 centavos de dólar (0,76%) e encerraram a sessão negociados a US$ 12,0100 o bushel. Com os ganhos, mostra o Valor Data, caiu para 9,29% a queda acumulada dos preços em setembro e para 1,09% a perda em 2008; nos últimos doze meses, a valorização soma 32,67%.

Se o clima no Meio-Oeste americano ajudou a soja, o mesmo não aconteceu com o milho, porque as notícias nessa frente foram favoráveis às plantações. E, também pressionados pela valorização do dólar, os papéis para entrega em dezembro (segunda posição) recuaram 4,50 centavos de dólar, para US$ 5,4450 por bushel - menor patamar em quase um mês. O dólar também tirou suporte do trigo. Em Chicago, os contratos de dezembro (segunda posição) do cereal caíram 13,25 cents, para US$ 7,3050 por bushel. Durante o dia, os preços chegaram a cair ao menor nível em um ano, antes de uma recuperação parcial no fim do dia.

"Ainda que, nesse momento, o dinheiro esteja fugindo e os investidores estejam observando as ações do governo americano, é improvável que as commodities agrícolas percam toda a sua atratividade", afirmou, de Nova York, Vinícius Ito, da Newedge. Ainda assim, não custa notar que o petróleo, principal referência para os fundos de índices que também investem em agrícolas, entrou em parafuso nas últimas semanas.

Ana Laura Menegatti, analista do braço agrícola da MB Associados, acredita que os baixos estoques limitam o espaço para fortes quedas das commodities agrícolas, mas reconhece que o momento é delicado e que em países que estão prestes a plantar a safra 2008/09, como o Brasil, os produtores têm de prestar muito atenção a seus custos, em geral mais elevados que em 2007/08.

"Pelo menos até agora os fundamentos indicam que o plantio não será muito afetado no Brasil", afirma Antonio Sartori, da corretora gaúcha Brasoja. Ele lembra que "o produtor é um eterno otimista" e vai plantar, e afirma que o risco de problemas climáticos na América do Sul ao longo do desenvolvimento da safra 2008/09 é grande. Na Argentina, por exemplo, uma seca prolongada acaba de reduzir a safra de trigo e o rebanho bovino.

segunda-feira, setembro 08, 2008

Açúcar - De um cenário de excedente para um cenário de déficit

As previsões sobre o mercado de açúcar parecem estar meio confusas como podemos ver na notícia abaixo da Reuters de 05 de setembro encontrada no site Brasil Agro.

De um cenário de excedente de 3,3 milhões de toneladas passamos para um déficit de 3,8 milhões de toneladas. Analisando estes números somente podemos sentar e verificar qual será o real resultado:

KINGSMAN ESTIMA DÉFICIT GLOBAL DE AÇÚCAR DE 3,8 MI T

A corretora e consultoria Kingsman revisou nesta sexta-feira a sua previsão para o balanço global de açúcar na temporada 2008/09, estimando um déficit de 3,8 milhões de t, em relação à previsão anterior de 3,3 milhões de t excedentes em 2008/09.

O escritório da Kingsman, em Lausanne, apontou como motivo da revisão a menor produção dos dois maiores produtores mundiais, Brasil e Índia, e a previsão de aumento do consumo na China e na Índia, o maior consumidor no mundo.

"O tempo úmido, o aumento dos custos de produção, a valorização do real e os preços mais altos do etanol puxaram os números de produção do açúcar para baixo (no Brasil)", afirmou a Kingsman.

"As perspectivas para a temporada 2008/09 na Índia também diminuíram com a tardia monção de chuvas em Maharashtra, que reduziu a produção de cana...", acrescentou.

Kingsman também elevou as previsões de consumo.

"O lado do consumo na equação também rendeu algumas surpresas, com o acréscimo de 1,4 milhões de t ao uso global desde a previsão de maio", declarou a Kingsman. "A China e a Índia estão no topo da lista no aumento do consumo.

"Na semana passada a Organização Internacional de Açúcar, localizada em Londres, previu um déficit mundial no mercado de 3,9 milhões de t em 2008/09, comparado com o excedente de 7,25 milhões em 2007/08.

Calor pode matar ervas daninhas segundo estudo da UNICAMP

A notícia abaixo é sobre 0trabalho de uma tese de doutorado da Faculdade de Engenharia Agrícola, onde com orgulho me formei, que mostra a possibilidade de matar ervas daninhas com o calor. Se isso se concretizar, seria algo muito interessante para a natureza pois diminuiremos a quantidade de herbicidas. Abaixo a notícia na íntegra que pode ser encontrada também aqui:

Exposição ao sol provoca morte de plantas daninhas
Raquel do Carmo Santos

Uma técnica alternativa ao uso de herbicidas contra plantas daninhas foi testada pelo agrônomo Marcos Roberto da Silva em tese de doutorado defendida na Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri). Trata-se da técnica de flamejamento, que consiste na exposição da planta ao calor por um curto espaço de tempo, promovendo a morte da planta daninha. O método, além de possuir baixo impacto sobre os recursos naturais, encontra aplicação tanto na agricultura orgânica como em culturas que não façam uso de controle químico ou biológico.

Um dos potenciais usuários da técnica pode ser prefeitura interessada em combater as plantas daninhas nas áreas urbanas. Como em muitos lugares o uso de herbicidas não é permitido, o flamejamento seria uma boa alternativa, principalmente em cidades praianas para se evitar uma possível contaminação de mananciais. Durante a pesquisa, Silva realizou aplicações também no combate a doenças, pragas e, ainda, no processo de dessecação da rama da batata – prática comum para se obter uma maturação homogênea do produto.

Marcos Silva foi orientado pelo professor Luiz Antonio Daniel em seu estudo, e contou com a parceria da empresa Antoniosi Tecnologia Agroindustrial, especializada em produção de máquinas agrícolas, instalada no município de Matão. O projeto teve o financiamento da Fapesp, por meio do programa de Pesquisa Inovativa na Pequena e Micro Empresa (PIPE). O agrônomo explica que a empresa produziu protótipos das máquinas flamejadoras e precisava de respostas sobre o comportamento da técnica em situações diversas.

O objetivo ao longo da pesquisa foi, justamente, entender os mecanismos para viabilizar a fabricação das máquinas em escala industrial. “No Brasil, pouquíssimos produtores aplicam essa técnica com eficiência, mas invariavelmente de forma artesanal e sem nenhum aparato de segurança. Por isso, a idéia de se entender o mecanismo para o credenciamento do produto”, esclarece.

As máquinas flamejadoras possuem basicamente um tanque de combustível GLP, componentes de controle e de segurança e um bico difusor (lança-chamas). Elas podem ser usadas em separado, em equipamentos manuais ou acopladas a um trator. Segundo Silva, não é necessária uma exposição demorada da chama para que a aplicação seja eficiente. “Uma simples sapecada leva à evaporação da água nas células e a conseqüente morte da planta sem produzir nenhum tipo de resíduo”, explica.

No Centro de Engenharia e Automação de Jundiaí, vinculado ao Instituto Agronômico de Campinas, onde foram realizados os testes, a estrutura para ensaios com semeadoras foi adaptada para o desenvolvimento dos ensaios com dois tipos de flamejadores, um de chama direta e outro de chama indireta (radiação infravermelha) e os tratamentos foram aplicados em quatro espécies de plantas daninhas, consideradas de importância econômica. Essas plantas se desenvolvem fora de lugar e, na lavoura elas geram preocupação, pois competem com as culturas por nutrientes, água e luz.

domingo, setembro 07, 2008

Multis do agronegócio remuneram melhor seus executivos

A reportagem de capa da Edição 926 da Exame, atualmente nas bancas, é sobre a remuneração anual dos executivos no Brasil.

Dentro da série de reportagens temos uma com o título "A Reação das Multinacionais" onde comenta-se o esforço das multinacionais em manter seus executivos através do aumento da remuneração.

Um estudo conduzido pelo Hay Group em 129 empresas mostrou que as empresas ligadas ao agronegócio (companhias agropecuárias, açúcar e álcool e insumos em geral) apresentaram o maior aumento na remuneração variável de executivos entre 2006 e 2007 devido principalmente ao fato do agronegócio estar crescendo e passando por um momento de consolidação e profissionalização, tornando-o mais vísivel aos investidores

A figura abaixo mostra a diferença da remuneração das empresas do agronegócio quando comparadas aos demais setores.

sábado, setembro 06, 2008

Small caps do Agronegócio - algumas sugestões de analistas

As small caps são ações de pequenas empresas que eventualmente podem passar despercebidas pela maioria dos investidores, entretanto, os analistas sempre estão de olho nelas e o artigo abaixo retirado do Portal Exame em 21 de agosto:

20 ações para o longo prazo

Os melhores papéis de small e mid caps na opinião de 30 especialistas financeiros consultados por EXAME

Por Bruno Toranzo e José Carlos Videira

Um dos enganos mais comuns entre os novos investidores do mercado de capitais é achar que as expressões small e mid caps se referem aos papéis de pequenas e médias empresas. Com faturamento de 2 bilhões de reais, a fabricante de carrocerias Marcopolo é uma das maiores companhias brasileiras. Mas, pelos parâmetros da bolsa, a Marcopolo é uma small cap — tem valor de mercado inferior a 5 bilhões de reais e volume diário de negócios na bolsa entre 200 000 e 4 milhões de reais. Na Bovespa, a CPFL, uma gigante do setor de energia, é apenas uma mid cap, por estar entre as companhias que têm valor de mercado entre 5 bilhões e 20 bilhões de reais e ações que negociam, em média, de 5 milhões a 25 milhões de reais por dia. Essas duas categorias de ações sofreram muito nos últimos meses com a saída de investidores estrangeiros da Bovespa, acuados pela crise internacional. Daqui para a frente, no entanto, a tendência é que vários desses papéis se recuperem. “Nem tudo o que caiu vai voltar a subir, mas esse é o momento em que empresas com histórias interessantes começam a se destacar”, diz Sérgio Goldman, diretor no Brasil da empresa americana de investimentos Bulltick. “Ainda há muitas small e mid caps baratas com perspectivas de valorização no longo prazo.”


Para apontar quais são elas, EXAME consultou 30 profissionais — entre analistas, gestores e consultores — dos principais bancos, corretoras, gestoras de recursos e assessorias de investimento do país. Só foram selecionadas as ações que receberam, ao menos, dois votos dos especialistas. Depois disso, essas indicações foram comparadas com um levantamento feito pela consultoria Economática, que analisou indicadores financeiros das companhias de capital aberto para apontar as mais promissoras. O resultado dessa extensa triagem são as 20 ações que constam desta reportagem. Isso quer dizer que o risco de algo dar errado é pequeno? Não. Num ambiente volátil como o atual, a chance de altos e baixos é grande — e algumas das ações recomendadas têm risco elevado. Para os especialistas consultados, porém, quem estiver disposto a agüentar solavancos e a deixar seu dinheiro aplicado por mais de um ano pode obter retornos interessantes com esses papéis. Além de terem potencial de alta para os próximos 12 meses, as ações listadas a seguir devem continuar se valorizando no longo prazo, dizem os especialistas. Espera-se que essas empresas sejam beneficiadas pelo crescimento econômico — que deve arrefecer, mas dificilmente ficará abaixo de 3% ao ano no curto prazo — e pelo grau de investimento, que costuma atrair recursos estrangeiros para ações de companhias de menor porte na bolsa. “O investidor que souber escolher empresas que ganham com esse cenário vai lucrar mais que a média da bolsa”, diz Alexandre Póvoa, diretor da gestora de recursos Modal.


China - nosso maior importador do agronegócio

A notícia abaixo do Estado de São Paulo mostra a tomada da primeira posição de importador do agronegócio brasileiro pela China:

CHINA VIRA O MAIOR CLIENTE DE PRODUTOS AGRÍCOLAS BRASILEIROS

As exportações de produtos agropecuários para o país praticamente dobraram em relação ao ano passado.

A China se consolida como principal destino dos produtos agropecuários do Brasil. De janeiro a agosto deste ano, as vendas para o mercado chinês cresceram 97,3%. Isoladamente, a China já concentra 13,1% das exportações brasileiras do agronegócio. Em segundo e terceiro lugares, aparecem os Países Baixos, com participação 9,4%, e os Estados Unidos, com 8,5%.

Considerando blocos econômicos, a União Européia continua como principal destino, comprando 33,2% das exportações brasileiras do agronegócio. Em seguida, vêm a Ásia, com 24,9%, o Nafta (9,7%), e a Europa Oriental (7,9%).

As informações foram distribuídas ontem pelo Ministério da Agricultura, em nota sobre o desempenho da balança comercial do agronegócio. Segundo a nota, a demanda mundial por alimentos continua favorecendo as exportações do setor.

De janeiro a agosto, as vendas externas de produtos agrícolas renderam US$ 48,5 bilhões, um crescimento de 28% em relação ao faturamento de US$ 37,897 bilhões no mesmo período de 2007. O setor teve um superávit de US$ 40,6 bilhões, 25% maior do que os US$ 32,398 bilhões de janeiro a agosto de 2007.

Os cinco principais setores que colaboraram para o bom resultado das exportações foram o complexo soja (+71,4%), carnes (+36,9%), produtos florestais (+11,2%), complexo sucroalcooleiro, (+5,4%) e café (+16%).

A receita cambial obtida com os embarques de soja em grão, farelo e óleo somou US$ 13,706 bilhões, contra US$ 7,997 bilhões em igual período de 2007. As exportações de carne vão superar em breve a marca de US$ 10 bilhões. Até agosto as vendas renderam US$ 9,845 bilhões.

Em relação ao destino das exportações, além da China, destaca-se o crescimento dos valores para os seguintes destinos: Aladi (66,5%, excluindo os países do Mercosul), Ásia (60,8%), Europa Oriental (44,9%), Mercosul (24,5%) e União Européia (22,7%).

Em agosto, as exportações do agronegócio somaram US$ 6,8 bilhões, aumento de 15,7% em relação a agosto de 2007. O superávit alcançou US$ 5,7 bilhões. Em 12 meses, as vendas externas atingiram a marca histórica de US$ 69 bilhões.

As exportações do complexo soja em agosto resultaram numa receita de US$ 1,8 bilhão, 44% a mais do que no mesmo período do ano passado, resultado puxado pela alta dos preços internacionais.

De acordo com o ministério, o preço da soja exportada foi 81% maior que o de agosto de 2007, e os de farelo de soja e óleo de soja, 63% e 61,3% superiores, respectivamente.

terça-feira, setembro 02, 2008

Crescimento explosivo do Marfrig

A revista Época Negócios do mês de agosto teve como reportagem o crescimento vertiginoso do frigoríifico Marfrig. Abaixo segue a reportagem na íntegra que também pode ser acessada clicando aqui:

Este jovem construiu uma múlti em dois anos

Eis uma história do novo brasil: a incrível saga de marcos molina dos santos, controlador do grupo marfrig. filho de açougueiro, abriu sua primeira empresa aos 16 anos e hoje, aos 38, possui 60 plantas em nove países.

por Alexa Salomão

“Segunda-feira eu tive uma grande e agradável surpresa. Fiquei sabendo que vocês compraram a empresa em que trabalho, a Moy Park, de Wisbech. Para mim é muito gratificante saber que uma empresa brasileira está se sobressaindo no cenário internacional. E agora, na fábrica, todos os meus colegas de trabalho, inclusive o manager, estão brincando comigo, me chamando de 'boss', claro, porque sou brasileiro. É muito bom saber que agora trabalho em uma empresa brasileira aqui na Inglaterra. É como se um pedacinho do Brasil estivesse aqui comigo. Isso me deixa muito orgulhoso."

O empresário paulista Marcos Molina dos Santos sorri quando se refere ao e-mail que recebeu de Osório Augusto Baggio, no final de junho, dias depois de conduzir a maior aquisição feita pelo seu grupo, o Marfrig, do setor de carnes.

Foram 15 plantas do grupo americano OSI, no Brasil e na Europa. Em meteóricos dois anos, o Marfrig abocanhou 25 empresas, sendo mais da metade no exterior. A compra do OSI foi a mais ousada. Com ela, de uma única tacada, praticamente triplicará seu faturamento para quase R$ 10 bilhões neste ano ano e passará a operar 60 plantas em nove países. O grupo, que já tinha unidades na Argentina, no Uruguai, no Chile e nos Estados Unidos, estende seus domínios para Inglaterra, Irlanda do Norte, França e Holanda, passando a operar diretamente em oito países, além do Brasil. Isso significa que quando a operação de compra for concluída, Molina será o controlador da mais internacionalizada empresa do agronegócio brasileiro, além da quarta maior processadora de carne bovina e uma das dez maiores de frango. Seu valor de mercado é de R$ 4 bilhões.

Entre os novos negócios está a fábrica inglesa Moy Park, do OSI, onde Baggio, emigrante brasileiro que se fixou na Inglaterra em 2005, está empregado. Cartas como a que ele enviou são vitamina para a sede de crescimento de Molina, um homenzarrão de poucas palavras que só interrompe o silêncio para soltar uma de suas marcas: uma gargalhada impagável (pergunte a ele, por exemplo, quantas horas de lazer lhe sobram na semana). Molina, de 38 anos, é o rosto mais jovem que desponta na onda de globalização das empresas brasileiras do setor de agronegócio. Até o momento, os holofotes permaneciam sobre a JBS, o antigo Friboi, que comprou a marca Swift e disputa a posição de maior empresa de bovinos do mundo com a americana Tyson Foods. A JBS, da família Batista, ainda é a maior em faturamento, mas o Marfrig de Molina alcança um número maior de países.

Neto e filho de açougueiros, o destino de Molina parecia traçado já na infância. Aos 12 anos, começou a trabalhar atrás do balcão do açougue do pai, em Mogi-Guaçu, no interior de São Paulo. Era um faz-tudo: ora atendia os fregueses e cortava a carne, ora assumia o caixa. Mas contrariando a tradição interiorana, Molina tinha pressa. Com apenas 16 anos, pediu ao pai que o emancipasse. Sua idéia era montar um negócio de distribuição de miúdos. Antes de começar já tinha os clientes - os maiores compradores do açougue do pai, com quem acertou as entregas antes de se aventurar sozinho. A pequena empresa começou a atuar na cidade e depois na região. Chegou a Campinas e depois alcançou a capital paulista. Aos 28 anos, Molina já se tornara um fornecedor de cortes nobres e importados para os melhores restaurantes e churrascarias da metrópole. O jovem Molina sempre se preocupou em ter o que é mais difícil nesse negócio: uma boa base de clientes. Em seguida, para atendê-los melhor, tentou vôos mais ousados. Foi além do negócio de distribuição e começou a comprar frigoríficos. O primeiro, em 2000, foi o Bataguassu, em Mato Grosso do Sul. Nunca mais parou.

O Marfrig ilustra com precisão um movimento de ascensão internacional que não é isolado na história recente do mundo corporativo. Faz parte de um novo fenômeno de proporções globais. Um número cada vez maior de empresas fundadas em países emergentes, como China, Índia e Coréia, está avançando para competir em países desenvolvidos. No Brasil esse movimento caminha de forma mais lenta (veja a reportagem Por Que Estamos atrás Deles), mas o exemplo do Marfrig aponta para uma nova geração de empresas brasileiras que começa a desbravar o mercado externo para crescer.

DESFILE DE MARCAS
O grupo Marfrig tem cerca de 30 marcas. Eis as mais importantes:

Marcos Molina é um empreendedor intuitivo. Não fez faculdade, não lê livros de negócios e não recorre a consultorias de gestão. É viciado em trabalho. Os clientes têm o número de seu celular e podem ligar até nas madrugadas. "Marcos consegue trabalhar 21 horas por dia", diz Márcia dos Santos, sócia integrante do conselho de administração e mulher de Molina. O casal se conheceu quando ela tinha 16 e ele 18 anos. Casaram-se cinco anos depois. Márcia sempre foi o braço direito do marido. Quando os primeiros frigoríficos foram comprados, na região Centro-Oeste do país, no início da década, era ela quem o acompanhava nas visitas às novas unidades. Todas as sextas-feiras, o casal embarcava com os dois filhos no jatinho da empresa e seguia para os frigoríficos. Analisavam a contabilidade, as linhas de produção e os relatórios de entregas.

"Muitas vezes trabalhamos aos sábados até a madrugada e voltamos para São Paulo ao meio-dia do domingo", diz Márcia.Ainda hoje, já com a gestão da empresa profissionalizada, Molina aproveita os feriados e os fins de semana para viagens de negócio em seu jato para colocar o trabalho em dia.

Simplicidade

Também é despojado. Trabalha em mangas de camisa e só usa terno quando o protocolo exige. No dia-a-dia dos negócios, é despachado. Fala e ri com sonoridade. Mas é de natureza tímida. Não gosta de comentar suas conquistas. "Não fiz nada disso sozinho. Tudo foi desenvolvido junto com o cliente, o fornecedor e toda a equipe do Marfrig. E com a minha mulher, que sempre esteve ao meu lado", afirma. No mercado, Molina é descrito como um homem que sabe ouvir para, em seguida, agir. "Em um jantar de negócios, Marcos passa a maior parte do tempo calado. Só fala ao final, por uns cinco minutos, diz o que vai fazer - e faz. Sempre do jeito mais correto e transparente", diz Arri Coser, sócio da rede de churrascarias Fogo de Chão e responsável pela internacionalização do rodízio gaúcho. Coser tem seis churrascarias no Brasil e 11 nos Estados Unidos. Quando começou a trabalhar com Molina, em 1995, comprava do Marfrig apenas 10% da carne do Fogo de Chão. Hoje essa parcela oscila entre 60% e 70% nas unidades brasileiras.

Uma das características que impressionam pessoas próximas é a simplicidade de Molina. Um desses interlocutores é Antonio Maciel Neto, presidente da Suzano Papel e Celulose e ex-presidente da Ford do Brasil. Maciel é conselheiro independente do Marfrig, ao lado de Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central, e de Marcelo Maia de Azevedo Corrêa, presidente do grupo Neoenergia. Maciel relutou em aceitar o convite da Fesa, a agência de recrutamento de executivos escolhida por Molina para ajudá-lo a profissionalizar a gestão do grupo Marfrig. "Eu não tinha tempo para mais nada, mas insistiram porque queriam me apresentar ao Marcos", diz Maciel. "Acabei aceitando e fiquei impressionado com a inteligência e o carisma dele." Outro traço que chama a atenção em Molina é sua visão estratégica certeira.

"As coisas nascem muito rapidamente na cabeça dele", diz Márcia. "Ele pensa sempre antes, na frente." Quando o Marfrig ainda era focado em carnes bovinas, Molina comprou o Patagonia, frigorífico especializado em cordeiros na Terra do Fogo, extremo sul do Chile. Orgulhoso, levou Márcia para conhecer o local. O casal chegou à região num dia gelado, abaixo de zero. Márcia espantou-se com a paisagem desértica. "O que tem nesse fim de mundo?", perguntou. "Duzentos e cinquenta mil cordeiros por ano", disse Molina. E cordeiros especiais, considerados orgânicos, porque pastam. Têm mercado garantido, já que a demanda por esse tipo de carne só cresce. Além disso, o Patagonia tem uma planta de 9 mil metros quadrados, clientes cativos na Europa, no Japão e na Rússia e toda a estrutura para o abate Kosher, o ritual exigido por judeus ortodoxos.

No mês seguinte, Molina surpreendeu de novo seu pessoal ao fechar a compra da Quickfood. O negócio não se encaixava na lógica das aquisições de brasileiros no exterior. Normalmente, o que interessa são frigoríficos com bons produtos para exportação. A Quickfood é uma empresa de alimentos que atende ao mercado interno e seu melhor ativo é a linha Paty, sinônimo de hambúrguer para os argentinos. Molina já conhecia o peculiar nacionalismo local, que em vários períodos da história interferiu nas regras de exportação e de importação, principalmente de produtos brasileiros. Em março deste ano, por exemplo, quando ruralistas fizeram barricadas contra a exportação de alimentos e o governo proibiu os embarques de carne, a Quickfood tornou-se um dos melhores negócios do Marfrig na Argentina.

Histórias como essa e a trajetória do Marfrig mostram que Molina aprendeu na prática a fazer o dever de casa no mundo dos negócios. Quando não passava de um pequeno comerciante de carnes, foi obrigado a negociar em um setor precário, com problemas de logística e de abastecimento. Em 1986, quando abriu a empresa, o Brasil vivia sob a pressão do Plano Cruzado e a escalada da inflação. O governo chegou a confiscar boi no pasto para manter o fornecimento. Para garantir cada naco de carne que vendia aos clientes, era preciso cultivar contatos e isso Molina sabia fazer. No início, cativou a clientela em Mogi-Guaçu. Depois foi para as cidades vizinhas, como Campinas e Águas de Lindóia. Em 1994, começou a fornecer para o Porcão, do Rio de Janeiro, uma das mais badaladas churrascarias do país. Foi quando percebeu que os melhores restaurantes tinham uma enorme carência de boas carnes. A partir de então, passou a sondar a capital paulista, onde o circuito gastronômico era bem maior. Em 1998, com vários clientes garantidos, transferiu a sede da empresa para Santo André, na região metropolitana de São Paulo.

Molina foi o primeiro a se preocupar em aproximar todos os elos de uma cadeia complicada. "Pecuarista, fornecedor e cliente viviam em guerra", afirma. "Na safra, sobrava carne e se comprava barato. Na entressafra, o preço subia e era uma luta garantir o produto. Tínhamos de começar a trabalhar juntos", diz Molina, que levou donos de restaurantes paulistanos para conhecer as melhores fazendas de gado da Argentina e do Uruguai. Também foi cicerone de produtores dos países vizinhos em jantares na capital paulista. Sentava-se à mesa com os dois lados, para intermediar contratos de fornecimento de longo prazo, sempre deixando claro qual seria a margem de lucro do Marfrig em cada negociação. "Os concorrentes diziam para não fazer isso", diz Molina. "Que depois os clientes iriam negociar sozinhos, mas não foi o que aconteceu." Com a estratégia, Molina garantia mercado para os produtores, carne para os clientes e espaço ao Marfrig. "A grande marca de Marcos foi propor parcerias quando ninguém se preocupava com isso. Ele trabalha em conjunto, é arrojado. Pensa e age muito rapidamente", diz o gaúcho Ari Nedeff, sócio majoritário de redes de rodízio como Novilho de Prata, Montana Grill, Pampeana, Galeteria Gaúcha e Boi Brasil. Nedeff compra do Mafrig toda a carne bovina e de porco que serve nas 14 churrascarias de sua rede.

Molina também foi o primeiro a oferecer produtos sob medida. Preocupou-se em entender que tipo de carne cada dono de restaurante queria no cardápio e negociou com os fornecedores para que produzissem cortes sob medida, que ele embalava a vácuo para garantir a qualidade. "Aprendi muito cedo que a carne não deve ser apenas bonita", diz Molina. "Deve ter qualidade, ser macia." Os cortes de Molina permitiram aos donos de restaurantes conceituados criar pratos antes impensáveis no Brasil por falta de matéria-prima. "A primeira vez que o vi, era praticamente uma criança. Tinha pouco mais de 20 anos e carregava uma caixa com peças de cordeiro em um dos braços e de bovinos no outro", diz o americano Peter Rodenbeck, sócio no Brasil dos restaurantes Outback e da rede de cafeterias Starbucks, e também o responsável pela chegada do McDonald's ao país, na década de 80. "Não nos entendemos muito bem no primeiro encontro. Ele era um jovem com forte sotaque do interior e eu um gringo que mal falava português. Mas ele deixou os cordeiros." As peças tinham alta qualidade e foram usadas no teste de novas receitas. Dois meses depois, o cordeiro de Molina foi incluído no cardápio da rede Outback. "É um cordeiro famoso até hoje", diz Rodenbeck.

O MAPA DA EXPANSÃO

Em oito anos, o Marfrig passou de distribuidor regional de cortes bovinos a uma das maiores indústrias de carnes do mundo, com mais de 60 unidades em nove países.

Carnes de todos os tipos

A obsessão de Molina em atender bem os clientes foi decisiva para a internacionalização do Marfrig. Dois momentos ilustram isso. O primeiro foi a desvalorização cambial de 1999. Naquela época, o Marfrig firmava-se como distribuidor de carnes importadas e teve as margens achatadas com a alta do dólar. Molina nem pensou em romper os compromissos assumidos. Mas deu-se conta da fragilidade em que a empresa se encontrava, por não ser uma exportadora. Mas para entrar nesse ramo precisava de um frigorífico. "Eu nunca quis ter frigorífico, porque era uma atividade polêmica e gosto do negócio de distribuição. Mas de repente o importador ficou malvisto. Virou atravessador", afirma Molina. "Exportando, poderia melhorar as margens e proteger a empresa da oscilação de preços", diz. Em 2000, Molina comprou seu primeiro frigorífico e, em 2001, começou a exportar.

Outro momento decisivo para transformar o Marfrig na empresa global que é hoje foi o surto de aftosa de 2005, que praticamente fechou as fronteiras do Brasil para a exportação de carne bovina in natura. Àquela altura, o Marfrig já exportava para 40 países. Molina percebeu que precisava proteger a empresa de imprevistos sanitários se quisesse crescer no mercado externo. "O cliente lá na Europa não queria comprar carne do Brasil e nós íamos perder mercado", diz Molina. Com unidades em outros países, o Marfrig poderia oferecer soluções completas. "Quem fizesse negócio com a gente compraria não só do Brasil, mas de outros países também." Mais uma vez Molina agiu rapidamente. Em 2006, comprou o primeiro frigorífico fora do Brasil, o Tacuarembó, então terceiro exportador do Uruguai. Hoje o grupo Marfrig abate 21,1 mil cabeças de gado por dia, em 18 unidades no Brasil, na Argentina e no Uruguai. Cerca de 37% de sua carne sai de abatedouros dos países vizinhos. Os contratempos enfrentados com o rebanho bovino apontaram outro problema a ser enfrentado pelo Marfrig: a dependência em relação à carne bovina in natura. Ficou claro para Molina que se a empresa se tornasse processadora, exportadora e importadora de carne, melhor que fosse de diferentes tipos e em diferentes estágios de preparo. Isso não só protegeria o negócio de futuros problemas sanitários com o boi como também aumentaria as margens do negócio, pois produtos industrializados são mais rentáveis.

Parte das aquisições feitas nos últimos dois anos já sinalizava essa intenção. Além de comprar frigoríficos de diferentes tipos de carnes, como o Chupinguaia, em Rondônia, e o AP&P, na Argentina, de bovinos; o Inaler, no Uruguai, que também abate ovinos; e o criador mato-grossense Carroll's, de suínos, o grupo Marfrig adquiriu também indústrias e marcas já consagradas. Arrematou empresas como a Mabella, que produz uma linha de embutidos com boa presença na região sul do Brasil, a Pena Branca, de frango, e a Mirab, que produz, na Argentina e nos Estados Unidos, o beef jerky, uma carne desidratada apreciada pelos americanos. Mas a estratégia ficou mais clara no final do ano passado, com a contratação de Sérgio Mobaier, executivo que estava há 16 anos na Sadia, para o posto de diretor de marketing. "A intenção é fazer do Marfrig uma indústria de alimentos que entrega produtos industrializados ao consumidor final", diz Mobaier. "E não apenas uma agroindústria."

A empresa planeja lançar novas linhas de marcas já consagradas, como a brasileira Bassi, reconhecida grife para churrascos e assados, que deve ganhar uma extensão de produtos de alta gastronomia. A recém-adquirida Da Granja, hoje restrita a hambúrgueres e empanados, também terá o portfólio ampliado. O Marfrig pretende ainda testar o potencial de internacionalização de marcas regionais. A primeira da lista será o hambúrguer argentino Paty, apreciado em alguns países da América do Sul e com bom potencial para entrar na Europa. Há expectativas também em relação às combinações comerciais que podem ser feitas em vários países com os empanados da marca Moy Park, que faz parte dos ativos comprados do OSI na Europa. Trata-se do maior processador de frangos do Reino Unido, dono de 80% do mercado de empanados, com acesso direto às redes de supermercados Tesco e Sainsbury. "O Marfrig terá um conjunto de marcas, como a Unilever", diz Mobaier. "Para integrá-las em uma única identidade, estudamos criar uma referência visual, um selo onde o nome Marfrig aparecerá."

A forma como o Marfrig cresceu pode parecer meio anárquica para os que olham de fora, mas revelou-se um trunfo. Como distribuidor, Molina aprendeu que a segurança do negócio está em ter a venda garantida. Assim, toda vez que comprava um lote a mais de carne, tinha cliente certo para vendê-lo. O mesmo ocorreu quando começou a adquirir frigoríficos. A produção de cada nova unidade já tinha destino. O raciocínio ele aplicou também para as exportações e para a internacionalização - cada nova empresa comprada vinha com clientes assegurados. "Ter o frigorífico é a parte fácil do negócio. Difícil é entender o cliente e fechar a venda", afirma Molina. O inglês James Cruden, diretor-operacional do Marfrig desde 2004, considera o modelo um dos grandes responsáveis pelo sucesso da empresa. "Marcos faz o caminho inverso dos concorrentes. Os frigoríficos têm o produto e precisam buscar o cliente. O Marfrig sempre teve o cliente e precisava buscar o produto. Ter o mercado é um grande diferencial." Há quase 40 anos no agronegócio, Cruden tem experiência para opinar. Trabalhou na Austrália, na Holanda e desde 1974 está no Brasil. Ocupou cargos executivos em empresas como o frigorífico inglês Anglo, o Bordon e a BF Alimentos, empresa de exportação mantida no início da década pelos concorrentes Bertin e Friboi.

Os tempos como distribuidor de carnes deram outra vantagem a Molina: contatos profissionais e pessoais com os quais ele teceu uma teia de relacionamentos em todo o Mercosul. Essa rede revelou-se estratégica para a profissionalização do Marfrig. Rodenbeck, do Outback, por exemplo, apresentou a Molina os executivos da Braslo, empresa criada no Brasil em 1982 pelo grupo OSI para fornecer hambúrgueres à rede McDonald's. O Marfrig tornou-se fornecedor da Braslo. Em 2002, foi criada a OSI Brasil, para administrar a Braslo e a Penasul, empresa de frangos do Rio Grande do Sul. Mais tarde, a proximidade com a OSI abriu portas para o Marfrig negociar a aquisição das operações do grupo no Brasil e na Europa. "Marcos foi de fornecedor a dono da Braslo em sete anos", diz Rodenbeck.

De sua agenda de contatos, Molina soube ainda extrair os talentos que contratou para profissionalizar o Marfrig. Boa parte da diretoria é composta por executivos com quem Molina um dia negociou. "Escolhi os que foram piores comigo", diz. "Sei que esses são os melhores." É o caso do irlandês James Cleary, diretor de planejamento e novos negócios, e o executivo à frente das aquisições mais ousadas do grupo neste ano. Cleary foi presidente do frigorífico Pampeano e convive com Molina há mais de dez anos. Em 2007, quando o Marfrig comprou o Pampeano, Molina convidou-o para o grupo. Outro exemplo é Bruno Stierli, responsável pelas operações de food service. Ele está na empresa há três meses, mas conhece Molina desde 2001, do tempo em que era gerente-geral da McCain do Brasil, empresa canadense especializada em batatas congeladas. "Molina sempre tentava barganhar, mas eu não dava moleza. Ele também não era fácil", diz Stierli.

A grande incógnita agora é saber se uma multinacional brasileira construída tão rapidamente, com pedaços de empresas diferentes e dispersas geograficamente, vai prosperar como uma indústria global. Molina estabeleceu alguns critérios para tentar blindar seu grupo e conquistar essa posição. Só compra empresas sadias, com equipes bem formadas, de preferência com profissionais com quem já fez negócios algum dia. "Na hora que analiso uma compra, vejo principalmente as pessoas", afirma. "A equipe precisa ter condições de tocar o negócio." Depois de fechar a aquisição, Molina preserva sempre que possível o comando. Quando comprou o Tucuarembó, no Uruguai, o frigorífico era comandado por um dos sócios, Martin Secco Arias. Ao assumir a empresa, manteve Arias na presidência. Em 2007, comprou novas unidades no país, tornando-se o maior exportador do Uruguai e também líder no abate de bovinos. Transformou, então, as operações no país em uma divisão, que foi entregue ao mesmo Arias. Tática idêntica adotou na Argentina. As operações locais estão com o argentino Luis Miguel Bameule, ex-Quickfoods. Os contatos com outros países são feitos pelo francês Alain Martinet, executivo com passagem pela Dreyfus, uma das maiores tradings do mundo. "Cada país tem sua cultura e é preciso respeitá-la", diz Molina. "Não adianta mandar um brasileiro, que não vai dar certo."

Na avaliação dos analistas, nada indica, até o momento, que algo possa dar errado na estratégia de crescimento do Marfrig, que, em meados de 2007, abriu o capital na Bolsa de Valores de São Paulo para fazer caixa e ampliar as compras. Na corretora Link, a ação da empresa está entre as recomendadas. "O Marfrig foca no aumento dos industrializados, o que vai elevar suas margens", afirma Rafael Cintra, analista de alimentos e de consumo da Link. "Além disso, diversificou a linha de produtos, entrando em frangos e suínos, internacionalizou a produção e só compra empresas saudáveis." Também pesa a favor do grupo o contexto internacional. O consumo de carnes está crescendo em mercados emergentes, principalmente na China, onde a população se urbaniza rapidamente e eleva a compra de carne bovina. Há ainda um componente político favorável. Estima-se que o aumento da inflação, que está encarecendo os produtos agropecuários no mundo todo, forçará os governos europeus a afrouxar barreiras sanitárias para elevar a compra de produtos mais baratos, como a carne brasileira. "O Brasil tem condições únicas de ser um grande fornecedor de alimentos para o mundo, e o Marfrig está aproveitando essa vantagem para se globalizar", diz Ricardo Florence dos Santos, diretor de relações com investidores do Marfrig. Santos trabalhou 16 anos no Pão de Açúcar, e é um dos executivos selecionados por Molina para atuar nessa nova fase de expansão da empresa.

REBANHO SORTIDO

O Marfrig investe na produção e na industrialização de diferentes tipos de carnes

Multinacionais emergentes

Para entender como um empreendedor saído do interior paulista constrói uma multinacional de capital aberto antes de completar 40 anos, é preciso analisar também o momento econômico mundial. A ascensão internacional do Marfrig não é um caso isolado. Um número cada vez maior de empresas fundadas em países emergentes está avançando para competir em países desenvolvidos como Estados Unidos, Inglaterra e Alemanha. Em 1998, apenas 12 companhias de países emergentes constavam do ranking das 500 maiores empresas da revista americana Forbes. Em 2006, esse número chegou a 48 e estima-se que mais de 100 estarão na lista até 2016. Alguns teóricos batizaram o novo fluxo de "segunda onda da globalização" e suas empresas de "multinacionais emergentes".

Boa parte do crescimento dessa nova safra de empresas se faz pela compra de outras, tanto em países emergentes quanto em países desenvolvidos. Isso está estabelecendo um novo patamar de competição e de consolidação em diversos setores. Entre os casos exemplares estão o da brasileira Vale, que arrematou a canadense Inco; a indiana Tata, que comprou a anglo-holandesa Corus; e a Mittal, que ficou com a francesa Arcelor. O efeito dessa transformação na arquitetura global dos negócios já é visto no Primeiro Mundo como ameaça às multinacionais estabelecidas.

Uma pesquisa da consultoria internacional de estratégia Roland Berger, obtida com exclusividade por Época NEGÓCIOS, leva o sugestivo título de Emerging Giants - Defending Your Market Share against the Impending Offense (algo como "Gigantes emergentes - defendendo sua participação de mercado contra a iminente ofensiva"). A pesquisa identifica quais características de gestão e estratégias das empresas emergentes foram decisivas para transformá-las em competidores globais e como as multinacionais de países desenvolvidos podem se proteger desses novos rivais. "As empresas de países emergentes estão em franca expansão internacional e se confrontam com as líderes", diz Thomas Kunze, sócio da Roland Berger responsável pela coordenação do estudo no Brasil.

A pesquisa aponta que as multinacionais emergentes estão se globalizando de uma maneira bem diferente da adotada pelas americanas e européias no passado. Companhias tradicionais, como a Ford, tornaram-se líderes nos Estados Unidos antes de se internacionalizar - e preferiram construir fábricas no exterior no lugar de comprar concorrentes. Boa parte das multinacionais emergentes cresce quando se internacionaliza e faz isso comprando empresas fora. A chinesa Haier, por exemplo, líder em eletrodomésticos no seu país, ganhou posições no mercado interno quando expandiu as atividades para toda a Ásia, comprando concorrentes. Outro diferencial das multinacionais emergentes é aproveitar o acesso direto às matérias-primas, tanto minerais quanto agrícolas. Muitas vezes, os insumos estão em outros países emergentes e elas não vacilam em buscá-los. A estatal russa Gazprom, líder no mercado global de gás, tem acordos de prospecção e extração em vários países emergentes na Europa Oriental, Ásia e América do Sul.

As primeiras multinacionais dos países desenvolvidos valeram-se da liderança tecnológica para conquistar o mercado global. Foi assim com os celulares lançados no mercado externo pela finlandesa Nokia e com os eletroeletrônicos da Philips, multinacional de origem holandesa que participa da criação de novos produtos desde a invenção da válvula, na década de 20. Poucas emergentes dispõem dessa vantagem. Algumas até avançam em novas áreas do conhecimento, como a indiana Ranbaxy, do ramo de medicamentos. Mas, em sua maioria, as novas multinacionais destacam-se por inovar na gestão. Rapidamente absorvem a cultura e os conhecimentos da empresa comprada e criam novas estratégias. "Por terem nascido em países com ambientes adversos para os negócios, as multinacionais emergentes são muito flexíveis e ágeis", diz Kunze. Um dos trunfos mais importantes, segundo a pesquisa, é ter no comando uma geração de novos líderes com forte espírito empreendedor e uma peculiar visão global para os negócios. Kunze os chama de presidentes-empresários. "São inovadores, ambiciosos e querem construir negócios internacionais", afirma. O representante máximo dessa linhagem é o indiano Lakshmi Mittal. Ele fundou sua empresa em 1974, aos 26 anos, e a transformou na maior do mundo comprando negócios ao redor do planeta. Quase todas as emergentes que ascenderam ao cenário internacional nos últimos anos têm à frente um líder expressivo, seja ele o fundador, o herdeiro ou um executivo visionário.

A pesquisa da Roland Berger não analisou o grupo Marfrig, mas ajuda a explicar por que os passos da empresa rumo à internacionalização foram bem-sucedidos. "Vários elementos da pesquisa aplicam-se ao que está ocorrendo hoje no setor de carnes no Brasil e em empresas como JBS, Sadia, Perdigão e Marfrig", diz Kunze. Um deles é a velocidade da internacionalização. Há oito anos, o Marfrig nem sequer exportava. Hoje é a empresa mais globalizada do agronegócio. Nesse movimento meteórico de internacionalização, o grupo valeu-se de uma vantagem destacada pela pesquisa: o acesso à matéria-prima. O rebanho de gado comercial do Brasil é o maior do mundo. Os dos vizinhos Argentina e Uruguai, por sua vez, estão entre os melhores. O Brasil também se destaca na produção e na exportação de frangos e de suínos, áreas de negócios nas quais o Marfrig cresce. Por fim, a empresa se beneficiou de uma gestão ágil e flexível, criada por um presidente-empresário com estilo e trajetória bem particulares.

segunda-feira, setembro 01, 2008

Gargalo logístico nos EUA também

Não é só no Brasil que temos gargalos logísticos quando ocorrem aumentos de produção. Veja abaixo a notícia do Valor Econômico de 28 de agosto:

GARGALO LOGÍSTICO ATINGE SAFRA AMERICANA

Em todo os Estados Unidos, ao lado de elevadores de grãos, enormes montes dourados de trigo e de milho aguardam vagões ferroviários para transportá-los ao mercado. Os grãos podem ficar aguardando um mês ou mais no solo, expostos a vento, chuva e ratos.

É o lado negativo do crescimento explosivo da demanda mundial por milho, trigo e soja americanos. O surto exportador está revelando ineficiências nas ferrovias, rodovias e rios que escoam os grãos que ajudam a alimentar o mundo. E esses gargalos estão custando aos agricultores, transportadoras e, em última instância, aos consumidores, milhões de dólares por ano.

Mark Hodges, diretor-executivo da Comissão de Trigo de Oklahoma, viu o problema com seus próprios olhos. No início do segundo semestre, quando consumidores demandavam mais do que nunca trigo e milho americanos, Hodges fez um giro de visitas aos elevadores de grãos locais. Viu pilhas de grãos que pareciam formigueiros gigantes aguardando o embarque. Administradores frenéticos não conseguiam encontrar vagões ferroviários suficientes para transportá-los.

"Quando colocamos trigo no chão, ocorrem perdas", diz Hodges. "Eles nunca gostam de pôr os grãos no chão, mas quando o trigo está custando US$ 7, US$ 8 ou US$ 10 por bushel, com ainda mais razão, eles não gostam mesmo de colocá-lo no chão".

Uma colheita surpreendentemente grande, neste segundo semestre, deverá testar mais o sistema. O Departamento de Agricultura dos EUA prevê a segunda maior colheita de milho e a quarta maior safra de soja na história.

Alguns grupos empresariais do agronegócio temem que os gargalos possam prejudicar o status dos EUA como fornecedor mundial, à medida que outros países - como Brasil e Argentina - competem por uma lucrativa participação no mercado.

Em anos passados, grandes colheitas fizeram com que milhões de bushels fossem armazenados fora de silos de grãos repletos, aguardando transporte. Grãos carregados em barcaças enfrentavam esperas em comportas e barragens antiquadas no rio Mississippi, aumentando o número de dias e o custo do transporte.

Apenas os atrasos nas barcaças acrescentaram, em média, US$ 72,6 milhões por ano ao custo do transporte de mercadorias nos rios Mississippi e Illinois, segundo uma nova análise do Corpo de Engenheiros do Exército (CEE), divulgado à Associated Press.

Atrasos ferroviários também são onerosos. Em 2006, cerca de 1 bilhão de bushels de grãos foi armazenado a céu aberto ou em abrigos improvisados em Iowa, Illinois e Indiana, acrescentando estimados US$ 107 milhões a US$ 160 milhões, naquele ano, ao custo de seu transporte, segundo estatísticas do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA). Isso corresponde a cerca de 1% do valor agregado, de US$ 13,8 bilhões, das exportações de milho e soja em 2006.

"Estamos muito atrasados em nossos investimentos em infra-estrutura, nos setores tanto privado como estatal", diz Peter Friedmann, diretor-executivo da Coalizão para Transportes Agrícolas, entidade que reúne exportadoras de grãos. "E precisamos tirar muito desse atraso ou veremos outros países nos ultrapassar, à medida que investem mais em sua infra-estrutura". O problema deve persistir, e mesmo se agravar, nos próximos anos.

Eliminar os gargalos necessitará bilhões de dólares em investimentos durante vários anos. Até que isso aconteça, as previsões são de que as exportações cresçam, sendo que os embarques de milho deverão crescer a cada ano durante a próxima década - de 54 milhões de toneladas para 77 milhões de toneladas -, segundo o Instituto de Pesquisas sobre Políticas Alimentares e Agricultura.

Custos adicionais por conta dos maiores gargalos só vão prejudicar agricultores americanos num setor extremamente competitivo no mundo. "Nessa atividade, preço é o que continua mandando", afirma Larry Jansky, negociante-sênior de commodities agrícolas na North Pacific , em Portland, no Estado de Óregon. "Dois ou três dólares por tonelada é a diferença entre ganhar ou não uma concorrência".

As exportações agrícolas no ano passado totalizaram pouco menos de US$ 90 bilhões. Se os Estados Unidos perderem somente 1% ou 2% desse mercado para países exportadores em rápido crescimento - como a Argentina -, isso poderá subtrair entre US$ 900 milhões e US$ 1,8 bilhão da economia.

De acordo com alguns economistas, os custos de transporte mais elevados podem prejudicar tanto agricultores como consumidores. Isso ocorre porque as companhias operadoras de elevadores de grãos ou de barcaças podem cobrir seus custos mais altos pagando aos agricultores um pouco menos por seu grão, ou cobrando dos consumidores um pouco mais pela mercadoria. O Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) não monitora o custo que os gargalos no sistema de transportes acrescentam anualmente ao preço dos alimentos.

Operadoras de elevadores de grãos ganharam prática no armazenamento de grãos a céu aberto, usando plataformas de concreto e lonas para garantir que apenas uma fração da colheita seja perdida, disse Marvin Prater, economista do USDA.

Porém, mesmo nas melhores condições, a armazenagem de grãos a céu aberto implica que a carga precisa ser "manuseada duas vezes", por ser colocada, primeiro, fora do silo, depois recolhida para ser colocada no silo e somente então despejada num vagão ferroviário. Em contraste, quando as coisas funcionam a contento, os grãos são carregados dos caminhões dos agricultores diretamente nos elevadores de grãos cujos funis os despejam em vagões ferroviários que já os aguardam. O duplo manuseio acrescenta entre 10 e 15 centavos de dólar por bushel, diz Prater.

A Associação das Ferrovias Americanas (AFA) estima que custará cerca de US$ 148 bilhões para expandir as linhas ferroviárias nos próximos 30 anos, para dar conta do crescimento da demanda. Mas a associação diz que as companhias ferroviárias podem apenas arcar com de 70% dos custos necessários.

A AFA e as companhias que operam no setor de agronegócios estão apoiando a aprovação de uma legislação que ofereceria créditos tributários para investimentos na expansão da capacidade de transporte ferroviário.

As barcaças que descem o Mississippi são há muito tempo uma alternativa de transporte mais barato para agricultores com acesso ao rio. Mas o seu tráfegi é dificultado por comportas e barragens construídas na era da Depressão. Esses atrasos acrescentam cerca de 50 horas ao tempo de viagem ao longo do trecho superior do Mississippi, segundo cálculos de Scott Whitney, gestor do Corps.

Os maiores gargalos estão nos movimentados portos americanos, onde os produtos agrícolas são carregados em navios oceânicos. Com o passar dos anos, os exportadores passaram a despachar cada vez mais os grãos alugando contêineres vazios que traziam bens de consumo para os EUA provenientes de outros mercados extrangeiros, como a China. Mas como essas importações diminuíram, as exportações estão sujeitas a maiores esperas, e a pagar mais, para conseguir espaço em navios que seguem para o exterior, disse Jansky, o comerciante de grãos em Portland. Jansky disse que o custo de alugar um contêiner de 20 pés mais que dobrou, para US$ 1,7 mil, apenas nos últimos 10 meses.