domingo, novembro 30, 2008

Um pouco de dados sobre o conflito Combustível x Alimentos

Sei que o tema não é novo, mas encontrei na Revista IdeaNews de maio de 2008, disponível clicando aqui no original, um artigo muito bom com vários dados sobre este tema. Esta revista é editada pelo IDEA (Instituto de Desenvolvimento Agrícola) de Ribeirão Preto e sempre traz muita informação do setor sucroalcooleiro.

O artigo na íntegra de autoria de Clivonei Roberto pode ser encontrado abaixo:


Parece que o tiroteio não tem mais fim. Os biocombustíveis continuam sendo alvejados por aqueles que acham que o etanol e o biodiesel são responsáveis pela alta dos preços dos alimentos. Uma saraivada de informações sem fundamento e acusações são veiculadas, mas comumente faltam dados precisos que ajudem delimitar as causas reais da alta dos preços e dimensionar a importância de cada uma delas. Para Miguel Biegai, economista e consultor da Safras & Mercado, há vários fatores que estão causando o aumento dos preços dos alimentos, e não apenas um ou outro isolado. Segundo Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura, realmente os biocombustíveis têm responsabilidade sobre a alta dos preços dos alimentos.

Mas com certeza não o produzido a partir da cana, e sim o de milho, feito nos Estados Unidos, e o de beterraba e trigo, entre outros itens alimentares, produzido na União Européia. Além desse, outros fatores são apontados por Rodrigues como causas da chamada “agrinflação” (inflação agrícola). Se de fato, como destaca Rodrigues, há uma certa influência dos biocombustíveis sobre o aumento dos preços, parece que esse fator tem recebido uma relevância maior do que tem em relação aos demais. Por quê? Nessa sinuca de bico, em que os interesses tentam ocupar o melhor espaço na mesa do jogo, quem e por quais motivos está tentando atingir os biocombustívies e especialmente o etanol produzido a partir da cana? Para alguns, não é o melhor caminho apostar na teoria da conspiração. Já o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi mais taxativo: disse que é leviandade os ataques contra os biocombustíveis e, mais recentemente no Peru, afirmou em alto e bom tom que as petrolíferas estão por trás disso e que os países não querem de fato mudar suas matrizes energéticas. Mas para enfrentar a campanha contrária à agroenergia e ajudar a dimensionar os verdadeiros “vilões” nessa celeuma da alta dos preços dos alimentos, muitos mitos devem ser quebrados.

Esta edição da Revista IDEA NEWS traz afirmações bastante divulgadas nos últimos meses sobre essa questão e procura ir além do senso comum, trazendo dados estatísticos e análises de especialistas sobre cada uma delas. Afinal, chega de tanto“achismo” e desinformação!

1 - Os biocombustíveis são culpados pelo aumento dos preços dos alimentos.

Analisando os dados apresentados por especialistas no assunto, é uma incoerência fazer essa afirmação. Eleito no ano passado como um ícone da luta pelo meio ambiente pela Revista Times, o físico nuclear José Goldemberg mostra com números porque não se deve fazer essa acusação. “A área dedicada à produção de biocombustíveis no mundo é de 10 milhões de ha; a área para agricultura é 1,2 bilhão de ha. Os críticos perderam completamente o senso de proporção”, afirmou Goldemberg em uma palestra que proferiu em Denver, nos Estados Unidos, no National Renewables Energy Laboratory (Laboratório de Energias Renováveis do Departamento de Estado de Energia). Principalmente quando se considera o combustível renovável feito a partir da cana-de-açúcar.

Trata-se de uma cultura que não é utilizada como alimento diretamente, mas se processada vira açúcar, comida para gado e até energia elétrica (além do etanol). Também tem um balanço energético muito mais favorável comparando o combustível fóssil e o etanol feito a partir de outras matérias-primas, como o milho. Mas para que o etanol de cana seja adotado amplamente no mundo não é preciso que o Brasil seja transformado em um grande canavial. Segundo Goldemberg, este etanol é uma experiência brasileira de sucesso, mas muitos outros países já produzem essa cultura e podem também fabricar o combustível.

“O Brasil só produz 25% da cana-de-açúcar mundial. Há cana em toda a América Central, na Índia, na África do Sul, em oçambique”, comenta. Mas se o etanol feito a partir da cana-de-açúcar não tem influência sobre a escalada dos preços alimentares, não se pode dizer o mesmo sobre o etanol feito a partir do milho, nos Estados Unidos, e o etanol e o biodiesel feitos a partir de outros itens alimentares na Europa (como trigo e granola). Nos EUA, há um modelo pouco eficiente para produzir etanol e que utiliza uma das commodities mais consumidas no mundo. Os americanos são os maiores produtores mundiais de milho (42% da produção mundial) e já estão destinando quase um terço desta produção para o combustível renovável.

Segundo Renata Marconato, da MB Agro, em 2007 os norte-americanos destinaram 79 milhões de t de milho para a produção de etanol, de uma produção total de 267,6 milhões de t (a produção mundial no ano foi de aproximadamente 696 milhões de t). No ano passado, os norte-americanos plantaram milho em uma área de 36,6 milhões de ha – 15% a mais do que em 2006. “Utilizar essa matéria-prima para o etanol é negativo. Ajuda a disseminar a imagem de ineficiência dos biocombustíveis, como no caso do milho, que consome muita energia para ser produzido e é uma matéria-prima que serve de alimento. Acho que atrapalha na commoditização do etanol em geral”, dispara. Biegai lembra que em 2008 os EUA devem utilizar 100 milhões de t de milho para o combustível – quantidade que conseqüentemente não estará disponível para alimentação. Segundo ele, a disputa da demanda energética com o etanol enxugou a oferta de milho no mundo, ficando mais caro ao mercado.
“Os melhores preços de milho e soja afetaram o trigo, o feijão e outros alimentos devido à disputa por terras para produzir energia”, relata o economista. Segundo Biegai, é preciso haver uma dissociação da agricultura de alimentos da agricultura de energia. Hoje, os preços dos alimentos estão subindo no mundo porque o etanol de milho produzido nos EUA, além do que é feito a partir de outros cereais ou produtos alimentícios na Europa e em outros países, estão saindo do quadro de bastecimento de comida. Biegai salienta que, no que se refere à dissociação alimentos x energia na agricultura, o exemplo mais próximo da perfeição de um modelo de agricultura de energia é da cana-de-açúcar no Brasil.Portanto, quem será que está destinando alimentos para transformar em combustível?

2 - O petróleo está pressionando o preço das commodities.

O preço do barril de petróleo já ronda a casa de US$ 135. Para o empresário Maurílio Biagi, da Maubisa, se por um lado isso pode ser positivo para o etanol, por outro ele se reporta à fala do presidente Lula, quando diz que se os preços dos alimentos sobem, cada vez mais se ataca os biocombustíveis, mas poucos erguem a voz contra as conseqüências da escalada do petróleo.“Há uma hipocrisia mundial, o preço do petróleo sobe e desce e nada acontece. Parece que essa onda contra o etanol está muito ligada ao desejo de se colocar uma cortina de fumaça em relação ao petróleo”, avalia Biagi. Para Biegai, não há uma névoa que encobre a influência do petróleo sobre os preços dos alimentos.

“Acredito que para uma parte considerável da população já está claro que os preços altos do petróleo são um dos elementos decisivos para a alta dos preços dos alimentos”, afirma. Comparando a crise do petróleo dos anos 70 com a escalada atual dos preços do combustível fóssil, Biegai salienta que existem diferenças. “Na década de 70, o choque do petróleo foi um choque de oferta.Os países exportadores resolveram afunilar a produção, valorizando artificialmente os preços”, diz. Ele explica que o mundo era muito mais dependente do petróleo e os países importadores tiveram dificuldades. Entre eles, o Brasil que, a partir dali, buscou o etanol como alternativa. O choque do petróleo observado hoje é um choque de demanda.O mundo está precisando consumir cada vez mais o combustível, e os países produtores não estão dispostos a aumentar o nível de produção.

Mas diante do aumento do preço do barril, os biocombustíveis têm uma importância decisiva e que poucos têm observado. “Se não fossem os biocombustíveis e as energias renováveis já existentes, os preços do petróleo estariam cerca de 20% mais altos do que hoje. Eles ajudam claramente a reduzir o déficit energético no mundo”, relata. Mas até que ponto os cartéis do petróleo vão permitir que as energias renováveis sejam cada vez mais viáveis (se já não estão agindo nos bastidores)?

3 - Uma das principais causas da alta é a elevação dos preços de insumos , como os fertilizantes. Segundo a pesquisadora Ana Cecília Kreter, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) – Seção de Política Agrícola, o aumento do preço do petróleo tem diferentes impactos para o produtor agrícola. O primeiro deles se refere aos insumos, o que reflete nos preços dos alimentos.“Para se ter uma idéia, os fertilizantes aumentaram 16% de janeiro de 2007 a janeiro de 2008, e os agrotóxicos e os combustíveis aumentaram 71% durante o ano de 2007, e de janeiro a abril deste ano, 14%”, diz. “Podemos ainda falar de impacto indireto, com custos de frete para o escoamento da safra, já que uma boa parte dela é transportada por rodovias.Em alguns casos, comparados com a safra do ano passado, os fretes aumentaram de 30% a 50%”, informa a pesquisadora do IPEA.

Segundo Oscar Fernandes, da Consultoria Sucrotec, os insumos que mais sofreram elevação em seus preços são os diretamente ligados às commodities mais demandadas pelos países emergentes da Ásia, principalmente China e Índia. Considerando o período de abril de 2000 a março de 2008, os insumos cujos preços mais subiram são o ferro e o aço (aumento de 312%), os adubos e fertilizantes (aumento de 265%) e o õleo diesel (aumento de 233%). Segundo ele, o comportamento destes itens não é uniforme. Porém, Fernandes concorda que, mais recentemente, o grande vilão da inflação de custos do setor agrícola como um todo são os adubos, os fertilizantes e os defensivos agrícolas. Em dois anos, a evolução do índice de preços de fertilizantes da FGV já aponta um crescimento de 100%, sendo 69% apenas nos últimos 12 meses. Segundo ele, o Brasil, mesmo sendo uma potência agrícola e aumentando ano a ano sua produção de grãos, carne, cana etc, é apenas o quarto consumidor mundial de fertilizantes, de acordo com a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). China e Índia têm um consumo anual desses insumos sete vezes superior ao brasileiro.

De acordo com Renata, os dois países se utilizam cada vez mais de fertilizantes e adubos com o propósito de garantir o crescimento vertical da produção agrícola, pela escassez de novas áreas para expansão horizontal.Segundo Asdrúbal Jacobina, gerente de custos de produção da Conab, além de citar os fertilizantes, ele lembra o aumento dos custos de sementes. No Brasil, pelo menos, onde cada região os preços têm um comportamento diferente, as sementes do milho tiveram variação de 13 a 15%, da soja de 30 a 50%, e do feijão de 27 a 50%.

4 - A cana está ocupando a área de alimentos no Brasil. Segundo Cid Caldas, coordenador geral de Açúcar e Álcool da Secretaria de Produção e Agroenergia do Ministério da Agricultura (MAPA), não se conhece dados precisos sobre a área agricultável exata do Brasil. “Existem estimativas que apontam entre 350 e 380 milhões de ha. A cana-de-açúcar é a terceira maior cultura em ocupação de terra (ocupa atualmente cerca de 7,8 milhões de hectares), atrás da soja (20,6 milhões de ha) e do milho (9,2 milhões de ha). Considerando que, pela média dosúltimos anos, metade da produção canavieira tem sido destinada à produção de etanol no País (a outra parcela para a fabricação de açúcar), cerca de 3,8 milhões de ha produzem cana queé transformada em álcool. Levando em conta 350 milhões de ha agricultáveis, isso representa pouco cerca de 1% de toda a área.

Ele relata que um recente estudo lançado pela Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) identificou que a expansão da cana-de-açúcar aconteceu, principalmente, em áreas de pastagem (65% das novas áreas). Dentre as áreas que já estavam ocupadas por outras culturas, a de soja foi a que mais cedeu espaço para cana-de-açúcar, especialmente nos estados do Mato Grosso, Goiás, Paraná e Minas Gerais.No entanto, a área de produção de soja ficou praticamente estável nestes estados, bem como a produção. Outra cultura que cedeu área para a cana-de-açúcar foi o milho, porém em escala desprezível. Mesmo assim, a produção de milho cresceu substancialmente. Tanto que, mesmo num ano em que a safra de cana baterá mais um recorde, a Conab anunciou que a produção brasileira de grãos será 7,8% superior à safra anterior, chegando a 142,08 milhões de t de grãos.


Também recorde. Um levantamento apresentado pela companhia estima que a área ocupada com as principais culturas seja de 46,97 milhões de ha, 1,6% superior à área cultivada na safra anterior. Segundo o relatório, nesta safra, considerando-se as principais culturas, confirma-se o crescimento da área plantada com milho, soja e trigo, destacando-se a soja com crescimento de 2,6% e o milho 2ª safra, com 9,2%. A área ocupada por cana, soja e milho no Brasil estão bem atrás da área ocupada pelas pastagens - 172,3 milhões de ha, segundo a Conab. Goldemberg ironiza, dizendo que em algumas regiões de São Paulo o gado é o mais confortável do mundo. “Os pastos aqui tinham 1,2 cabeça/ha”, conta. As pastagens perderam um pouco de espaço, mas essa média é atualmente, segundo ele, de 1,4 cabeça/ha. Apesar disso, nos últimos anos, o rebanho bovino do Brasil cresceu cerca de 13% e o País é o segundo maior produtor de carne do mundo.

5 - A especulação financeira é uma das causas da “agrinflação”. Biegai lembra que sempre houve especuladores no mercado de commodities, e eles são benéficos para o sistema porque geram a liquidez necessária para que indústrias e produtores possam reduzir os riscos relacionados à comercialização das mercadorias. Porém, em função da instabilidade em alguns mercados financeiros (em parte causado pela crise das subprimes norte-americanas), houve um aumento maior do que o normal de especuladores direcionando ativos para o mercado de commodities.

"Este movimento ocorreu principalmente na posição ‘comprada’, valorizando os contratos futuros das commodities agrícolas nas bolsas norte-americanas, e puxando as cotações dos alimentos no mundo todo”, avalia.As especulações no mercado agrícola internacional já fazem com que os preços estejam sujeitos a alterações bruscas. A negociação no mercado futuro chega a movimentar o equivalente a 22 vezes o volume das safras anuais de soja.

6 - Os emprendimentos sucroalcooleiros produzem alimentos no Brasil pelo sistema de rotação de cultura.

A produção poderia ser muito maior. Segundo Denizart Bolonhezi, engenheiro agrônomo e pesquisador científico da Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo, nos últimos anos, devido às grandes expansões, foram destinados à renovação de cultura nos canaviais próximo de 12% (488 mil ha no Centro-Sul). Desse total, apenas 50 mil ha são cultivados com amendoim e 150 mil ha com soja. Outros 200 mil ha são utilizados para plantio de adubo verde (Crotalaria). Ele frisa que, embora o potencial para a rotação no Centro-Sul deva chegar a 1 milhão de ha nos próximos anos, com a possibilidade de duplicar a área para o plantio de grãos, hoje ainda o modelo de rotação não é explorado na sua totalidade para produzir alimento. “Por praticidade, as usinas dão preferência ao cultivo de adubos verdes, pois necessita de pouco investimento em máquinas, não requer pulverização constante etc”, diz. Embora o modelo seja útil, perde-se uma oportunidade.

7 - Há um desequilíbrio entre a oferta e a demanda de alimentos no mundo.Um dos motivos para os preços dos alimentos estarem subindo também é o aumento da demanda, provinda principalmente da Índia e da China. Estes países possuem quase 40% da população do mundo e estão em profundo processo de urbanização, o que repercute na mudança de hábitos alimentares, acarretando maior necessidade de alimentos. Segundo Biegai, o processo de urbanização que China e Índia estão passando ainda deve durar por 20 anos. “Esta pressão por commodities (não só de alimentos) destes dois países deve persistir por este período, pelo menos. Parte da pressão sobre os alimentos nos próximos anos virá desse fator”, diz Biegai. Segundo Renata, da MB Agro, um dos fatores que mais merece destaque é o aumento de consumo de proteína animal.

Tem havido mudanças geopolíticas importantes, caracterizada pela inserção de milhões de pessoas, anualmente, no mercado consumidor, especialmente na China e na Índia, e com grande potencial de expansão. Hoje a China tem 40% de sua população vivendo em cidades. A Índia tem 29%. Também se verifica a mudança do perfil alimentar das pessoas, inclusive por conta do aumento da renda e da urbanização. O consumo per capita de carne, por exemplo, se mantém estável nos Estados Unidos: na casa de 110 kg/habitante/ano desde 1999. Na Europa está na casa de 82 kg. No Brasil, era de 71 kg em 1999 e deverá chegar a 92 kg em 2016. Já na China esse consumo cresce a galope. Era de aproximadamente 44 kg por habitante em 99, hoje é de cerca de 59 kg e deverá chegar a 66 kg em 2016. E uma coisa é 180 milhões de brasileiros comerem 86 kg no decorrer do ano (estimativa para 2008).

Outra coisa é os mais de 1,3 bilhão de chineses incluírem no cardápio 59 kg de carne no mesmo período. Segundo os dados apresentados por Renata, é necessário 1,2 kg de grãos para produzir um kg de carne de frango, 2,9 kg de grãos para 1 kg de carne suína e 3,2 kg de grãos para 1 kg de carne bovina. Basta fazer as contas. Para se ter uma idéia, analisando apenas os números de produção e consumo de óleo de soja apresentado pelo relatório de maio da USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos), a China produziu, na safra 2005/2006, 6,15 milhões de t, mas consumiu no período 7,61 milhões de t.
A diferença foi suprida pelas importações. Na safra 2006/2007, o país asiático aumentou sua produção de óleo de soja, atingindo 6,34 milhões de t, mas o consumo aumentou numa proporção muito maior: foi de 8,6 milhões de t. Já a estimativa para o período 2007/2008 é de que a produção chinesa seja ainda maior: 6,8 milhões de t. Mas o consumo doméstico do produto vai dar mais um salto impressionante. Deverá ser de 9,79 milhões de t. Aumento de cerca de 1 milhão de t de um ano para o outro.

8 - Os subsídios agrícolas dos países ricos influenciam os preços dos alimentos

Recentemente o presidente francês Nicolas Sarkozy acusou Brasil e Estados Unidos de praticarem dumping na produção de biocombustíveis.Mostrou estar bastante desinformado, segundo Biagi. Quando se fala sobre os Estados Unidos, essa afirmação é correta. Para produzir seu etanol, o governo norte-americano injeta um subsídio de US$ 0,51 por galão produzido e uma proteção tarifária de US$ 0,54 por galão contra o etanol brasileiro. Os gastos anuais com subsídios para o combustível cachegam a quase US$ 9 bilhões. Estados Unidos e União Européia investem bilhões todo o ano para proteger produtos agrícolas como laticínios, arroz, trigo, milho e carne.Esses subsídios criam uma situação artificial de mercado, que mina a competição igualitária de outros países produtores.

Por isso, quando o presidente francês inclui o Brasil nas suas críticas, está se esquecendo que a própria França é um dos países mais protecionistas da Europa. E se há uma preocupação com a fome no mundo e a alta dos alimentos, certeiro foi o ministro das Relações Exteriores do Brasil Celso Amorim: “olha, em vez de reduzir para US$ 14 bilhões [os subsídios dados pelos] os Estados Unidos e US$ 20 bilhões [os subsídios pagos pela] a Europa, o ideal seria reduzir a zero”, sugeriu Amorim ao reagir diante de declarações do diretor-geral do FMI (Fundo Monetário Internacional), Dominique Strauss-Khan.

“Como foi reconhecido pelo próprio diretor-geral da FAO, o que impediu o crescimento da produção de alimentos em países africanos e sul-americanos foram os subsídios, não foi o biocombustível”, afirmou o ministro. “Pelo que me consta, na África ninguém deixou de produzir alimento para produzir biocombustível. Eles não produziam alimentos e continuam sem produzir, porque os subsídios agrícolas da Europa e dos EUA impedem que isso ocorra”, disse.

9 - A cana avança ou empurra outras culturas sobre os biomas do cerrado e da Amazônia .


Para Malu Ribeiro, coordenadora da Rede das Águas da Fundação SOS Mata Atlântica, a cana tem ocupado acentuadamenteáreas do cerrado brasileiro. O argumento da agroindústria canavieira, de acordo com ela,é de que essas áreas são degradadas. “O setor tem razão quanto à produção de apenas um boi por hectare. É preciso uma produção mais sustentável, mas será que com o tempo isso não pode gerar problemas?”, indaga. Ela também diz que a cana, especialmente em São Paulo, tem sido a cultura preferida pelo pequeno produtor. “É mais rentável arrendar para a usina do que plantar, o que está acabando com a agricultura diversificada em certas regiões”, observa.

Malu acredita que o etanol é uma alternativa viável ao petróleo. “O lobby do petróleo criou um modelo inadmissível.” Mas ela salienta a importância do desenvolvimento do combustível renovável de maneira sustentável. Para isso, lembra que o zoneamento para cana é muito importante à medida que vai garantir o respeito aos recortes dos bioamas. A previsão é de que nos próximos meses o governo federal apresente este zoneamento. Para Cid Caldas, falar que a cana-de-açúcar está invadindo a Amazônia é uma bobeira. A expansão está ocorrendo em regiões do Centro-Sul (oeste paulista, Goiás, Minas Gerais e Mato Grosso). Existem diversos fatores que tornam inviável a produção de cana-de-açúcar na região amazônica: distância dos centros de consumo, dos centros de manutenção de equipamentos das usinas, dos principais portos do país, sem contar a inaptidão agrícola da região (as condições climáticas e de solo são desfavoráveis para a cana-de-açúcar).

O uso de terras da floresta amazônica para cultivo de cana enfrenta profundas dificuldades técnicas, pois o volume de chuvas na região não permite o amadurecimento da cana. “O principal problema de desmatamento da Amazônia é para exploração ilegal de madeira e estima-se que cerca de 5% da produção de soja provém de região de bioma amazônico”, diz Caldas. Segundo Biegai, no cerrado tem sido reportado incremento de moderado a discreto de área plantada de cana-de-açúcar, especialmente a partir da ocupação de pastagens degradadas.

Mas está muito longe de o Centro-Sul se tornar um mar de cana. A área ocupada com cana no Brasil precisaria aumentar em quase 50 vezes para que esta expressão começasse a se aproximar de algo parecido, segundo ele. “Mesmo que precisemos produzir 200 bilhões de l nas próximas décadas, nem assim a cana vai atingir tanta área, por conta do aumento da produtividade esperada para os próximos anos, assim como outras inovações tecnológicas que aumentarão a rentabilidade litros/hectares/ano”, diz.

10 - Atribuir aos biocombustíveis a culpa pela escalada dos preços dos alimentos tem motivos político-ideológicos.

Para Biegai, boa parte das críticas endereçadas aos biocombustíveis nessa discussão tem uma razão: o desconhecimento. “As pessoas tendem naturalmente a ter medo do que não conhecem”, analisa. As críticas talvez também tenham uma boa dose de sentimento anti-americano, por conta da explosão da produção norte-americana de etanol. Ou mesmo uma resistênciaà possibilidade de países emergentes, como o Brasil, terem no combustível renovável uma fonte de crescimento e libertação do petróleo.“Essa gritaria [de críticas contra os biocombustíveis frente à alta dos preços dos alimentos] é uma cortina de fumaça. A razão da crise é a hipocrisia do protecionismo”, diz Biagi.

Para Goldemberg, está havendo uma ofensiva violenta dentro dos Estados Unidos contra a utilização de etanol feito do milho e isto acaba refletindo na produção do etanol de cana. “São processos diferentes, mas estão sendo colocados no mesmo barco. Mas é uma postura política. É acusação ideológica e apaixonada”, diz. Frente a essa discussão, cabe ao Brasil aproveitar as oportunidades, inclusive criada pelo aumento do consumo mundial de alimentos, e buscar sempre quebrar os mitos que há décadas tentam tolher seu progresso. Nosso exercício de quebrar mitos continua...

quinta-feira, novembro 27, 2008

Mais um grande do petróleo no etanol?

Encontrei no site Gas Virtual a nota abaixo, publicada no dia 24 de novembro, que diz que a Shell está finalizando a compra da COSAN. A nota pode ser encontrada na íntegra aqui:

Shell, gigante do petróleo, aposta no etanol brasileiro

A Shell está praticamente fechando a compra da Cosan, maior produtora nacional de açúcar, álcool e etanol. O grupo de Piracicaba (SP) foi destaque no noticiário, em maio, ao abocanhar a Esso do Brasil. No negócio, que pavimentaria sua estréia na revenda de combustíveis, pagou quase R$ 1 bilhão. Pelo visto, o projeto não emplacou. (Fonte: Ricardo Boechat - Isto É)

Nota: Em junho deste ano o Portal GasVirtual publicou:A gigante do setor de petróleo acredita que os biocombustíveis podem ser "muito atrativos" e nega que o etanol esteja gerando um lobby do setor de combustíveis contra países como o Brasil.

A empresa, porém, alerta: não irá apostar no etanol de milho nos Estados Unidos. "Quando se analisa a produção de cana, como no Brasil, está claro que se trata de um setor atrativo para investimentos e achamos que esse modelo no Brasil é sustentável em termos ambientais", afirmou o chefe mundial do departamento de tecnologia da Shell, Jan van der Eijk. "Tudo indica que o etanol de cana é bom para a economia e para o meio ambiente. Portanto, é um bom investimento, com lucros promissores, e vamos seguir essa tendência", disse. Van der Eijk explica que a Shell irá investir tanto no etanol de cana como no desenvolvimento de um etanol de celulose.

"São esses os modelos que fazem sentido econômico e estamos considerando o envolvimento da Shell nesse setor. Não estamos considerando usar nem o milho nem trigo", alertou. O motivo da recusa pelo etanol produzido nos Estados Unidos a partir do milho seria a necessidade de altos subsídios para que o produto seja competitivo no Mercado.

quarta-feira, novembro 26, 2008

Petrolíferas atacam no etanol?

Duas notícias publicadas recentemete mostram o interesse da Petrobras e da BP no etanol brasileiro. A BPque já possui uma unidade de biocombustíveis e atua em parceria com grupos nacionais no setor mostra seu interesse pelo etanol em reportagem do JB Online de 25 de novembro e também agora parece, segundo notícia da Agência Estado de 24 de novembro, que a Petrobras está com sérios interesses no setor:

PETROBRAS DEFINE ESTE ANO SE COMPRARÁ USINAS DE ETANOL

O presidente da Petrobras Biocombustível, Alan Kardec Pinto, reiterou hoje que a revisão do planejamento estratégico da estatal deverá incluir a possibilidade de a companhia adquirir usinas existentes de etanol no País e aproveitar oportunidades que poderão surgir a partir da queda nos preços dos ativos, provocada pela crise financeira global. "Nós propusemos participar da compra de usinas existentes, mas não queremos tumultuar o mercado, tudo dependerá da revisão do planejamento estratégico da empresa, previsto para dezembro", disse.

De acordo com o executivo, a crise não alterou o programa da companhia que prevê a construção de 20 unidades produtoras novas (Green Field) que deverão ser instaladas preferencialmente na região Centro-Oeste do País, onde a companhia pretende também instalar um alcoolduto. Até agora, apenas um projeto saiu do papel, o da usina Itarumã, em Goiás, que será construído em parceria com a japonesa Mitsui, com investimentos previstos de US$ 227 milhões para a produção de 200 milhões de litros a partir de 2010. Os contratos de EPC (Engineering, Procurement and Construction) deverão ser assinados no início de 2009.

Segundo ele, o etanol continuará competitivo, mesmo com a queda das cotações do barril de petróleo. "O etanol é competitivo com o barril até US$ 40", disse ele. Conforme o presidente da Petrobras Biocombustível, o escopo do projeto de instalação de novas usinas não sofreu alterações e continuará com enfoque na produção de etanol para a exportação, sendo que a viabilização do empreendimento contará com a participação da iniciativa privada (majoritária), além de um parceiro internacional. "Os atores internacionais têm pressa em introduzir o etanol em sua matriz energética e o principal motivador disso é o Protocolo de Kyoto", argumenta. Neste sentido, ele acredita que o Brasil é o país que terá maiores condições de atender à demanda e, por isso, a idéia é que as usinas sejam instaladas já com a garantia de demanda externa e com contratos de longo prazo. "Foi o que aconteceu na parceria com a Mitsui, que garantiu o mercado", explicou.

A Petrobras já possui uma meta de exportação de 4,75 bilhões de litros de etanol até 2012 e por isso, segundo Alan Kardec Pinto, a intenção é tirar o restante dos 19 projetos de usinas do papel até o próximo ano. Da mesma forma, até 2011, a empresa espera que já esteja concluída a primeira etapa do alcoolduto que irá entre Uberaba (MG) e São Paulo para escoar a produção destes empreendimentos, a partir do Porto de São Sebastião (SP) ou do Rio de Janeiro. Tão logo sejam fechados os projetos de usinas no Estado de Goiás, a empresa pretende instalar a segunda etapa do projeto, entre Uberaba e Senador Canedo (GO), o que levaria mais um ano.

Outro ponto observado pela Petrobras na instalação de usinas de etanol é a possibilidade de comercialização de energia gerada a partir do processamento da cana-de-açúcar. A Usina Itarumã deverá gerar 50 megawatts (MW) de energia, dos quais um terço será consumido internamente e o resto poderá ser comercializado. Kardec Pinto não revelou o valor dos recursos que serão aplicados pela companhia nos projetos, que também serão avaliados na revisão do planejamento estratégico da companhia.

PARA BP, ETANOL É OPORTUNIDADE

Um dos maiores grupos petroquímicos do mundo, a britânica BP, aposta no etanol de cana-de-açúcar como uma alternativa sustentável de biocombustível e como oportunidade de negócios para sua estratégia corporativa.

A vice-presidente de Políticas Corporativas e Comunicações da BP, Anne Ruth Herkes, declarou que ´a BP decidiu apostar no etanol, porque enxerga uma excelente oportunidade de negócios nesse produto e entende que a produção deve ser muito bem feita, em linha com as melhores práticas de trabalho e produtividade´. E completou que ´ao investir na Tropical Bioenergia e na cana-de-açúcar, a BP reconhece a eficiência energética e a sustentabilidade ambiental da produção de etanol de cana, que não compete com alimentos´.

Ao se referir a alguns estudos contrários ao uso do etanol, a representante da BP esclareceu que após revisar esses trabalhos a companhia acredita que são inconclusivos e que existem diversos estudos muito bem fundamentados que mostram o oposto. ´O objetivo da BP no setor de bioenergia é incentivar os melhores biocombustíveis´, concluiu. Herkes esclareceu que a BP, além do etanol no Brasil, também investe em outras iniciativas para a produção de biocombustíveis.

Szwarc destacou que ´o futuro da indústria no Brasil, a exemplo dos demais segmentos da economia, não está imune às dificuldades do curto prazo, especialmente quanto à disponibilidade de créditos para financiamento da safra, exportações e estoques. No entanto, ressaltou que em médio e longo prazos as perspectivas são muito positivas para o setor.

´Os fundamentos do mercado continuam sólidos, porque tanto o açúcar como o etanol continuarão a ser consumidos e de modo crescente. O que se observa é uma diminuição na velocidade de expansão da produção, que deverá se ajustar às condições de mercado´, completou.

A companhia foi a única petroleira a fazer uma apresentação no 17º Seminário da Organização Internacional do Açúcar (ISO), realizado em Londres, no qual a União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica) também participou .

segunda-feira, novembro 24, 2008

Biotecnologia descrita de modo fácil

Um artigo escrito pelo pesquisador AntAntonio Batista Filho, Diretor do Instituto Biológico (IB-APTA-SAA), descreve de forma interessante e clara a biotecnologia para leigos. Abaixo o texto na íntegra que também pode ser encontrado no site da APTA (Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios) clicando aqui:

A biotecnologia e o agronegócio
28/10/2008

No início do século XIX, a palavra biotecnologia teria sido usada pela primeira vez por um engenheiro da Hungria. Entretanto, a aplicação de técnicas biotecnológicas já era conhecida desde 1800 AC, para fabricação de vinho, pão, cerveja, queijo e outros produtos através da fermentação. Nos últimos 30 anos, a biotecnologia teve formidável avanço, abrindo novas oportunidades de crescimento para diversos setores da economia, entre os quais se destaca a agricultura, e tem como maior desafio o uso sustentável de nossa biodiversidade.

A biotecnologia é uma ferramenta tecnológica adicional para a agricultura. Ela impulsiona o crescimento do agronegócio nos países onde já são produzidos alimentos através dessa técnica e têm exercido um papel importante para aumentar a produtividade e atender a demanda por alimentos de uma população em contínuo crescimento. Aliás, em qualquer setor da economia, o que alavanca a competitividade das empresas é a tecnologia. É a tecnologia que reduz os custos, aumentando a qualidade e a produtividade, e coloca os produtos ao alcance do gosto e do bolso do consumidor de dentro e de fora do país.

Até 2050 a população mundial deverá alcançar 11 bilhões de pessoas, o que vai exigir que, no mínimo, seja dobrada a produção de alimentos e, de preferência, sem aumentar drasticamente a área plantada, minimizando assim o impacto sobre nossa biodiversidade. Não há outro caminho senão o uso de tecnologias que permitam maior produtividade por unidade de área.

O Brasil será parte fundamental para suprir considerável parcela de alimentos que o mundo demandará e terá que adotar ações sustentáveis para preservar nossos ecossistemas. A revolução verde iniciada nos anos 1960 trouxe, para o mundo, aumento na produção de alimentos, mas o uso abusivo de insumos também acarretou problemas como a contaminação ambiental e de saúde. No momento atual, a biotecnologia tem a responsabilidade de também aumentar essa produção sem, no entanto, provocar efeitos irreparáveis ao ambiente.

A genética clássica também foi fundamental para o avanço do agronegócio. O programa de melhoramento genético de zebuínos, desenvolvido pelo Instituto de Zootecnia (IZ-APTA), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento (SAA), resultou em ganho genético médio anual de 3 kg, somando 90 kg de incremento de peso nas progênies dos reprodutores nos 30 anos de desenvolvimento do projeto. Exemplos semelhantes a esse foram observados em vários segmentos da agropecuária.

A adoção da biotecnologia na agricultura cresce a cada ano. Em 2003, 18 países já cultivavam plantas geneticamente modificadas em escala comercial, totalizando 68 milhões de hectares, segundo dados do Serviço Internacional para a Aquisição de Aplicações de Agrobiotecnologia (ISAAA). Em 2008, os transgênicos já ocupam mais de 100 milhões de hectares, distribuídos por 25 países.

Hoje, em vários países, já existem plantações de alimentos geneticamente modificados. Esses alimentos são resistentes a pragas e, por isso, utilizam menos agrotóxicos. Plantas tolerantes a herbicidas têm sido desenvolvidas e permitem aos agricultores também usar menos agrotóxicos para combater plantas daninhas. Com isso diminuem os gastos, além de aumentar a qualidade dos alimentos. Algumas das principais doenças de nossas culturas depositam na transgenia a esperança de controle, entre as quais o feijão transgênico resistente ao vírus do mosaico dourado e o Greening dos Citros (Huanglongbing).

O potencial das variedades obtidas por recombinação genética também está sendo utilizado para produzir alimentos com mais vitaminas e nutrientes, frutas que demoram a amadurecer e plantas capazes de resistir a fatores ambientais adversos, como secas, inundações, mudanças acentuadas de temperaturas, tolerância ao excesso de acidez e salinidade. No futuro, a obtenção de plantas com melhor aproveitamento da água deverá ser uma realidade.

No Brasil, após um início lento, observa-se agora maior agilidade para liberação de sementes e vacinas transgênicas, sendo que até agora 12 licenças foram concedidas. Ainda assim o país já é o terceiro em área plantada com transgênicos, atingindo próximo de 15 milhões de hectares, o que representa uma participação global de mais de 10%. Acima de nós aparecem a Argentina, com 19 milhões, e os Estados Unidos, com 58 milhões. A tendência é de crescimento acelerado, razão da crise alimentar, da questão energética e das mudanças ambientais.

Um grande evento para a biotecnologia brasileira aconteceu com o pioneirismo dos primeiros projetos Genoma, iniciado em 1997 com o sequenciamento do genoma do primeiro organismo patógeno de uma planta, a bactéria Xylella fastidiosa, que provoca a doença conhecida por “amarelinho” nos laranjais. No ano 2000, o genoma dessa bactéria já estava concluído e deixou como legado expressiva competência instalada em genética molecular, produzindo resultados na fronteira do conhecimento. Veio depois o sequenciamento dos genomas da bactéria Xanthomonas axonopodis, causadora do cancro cítrico, e do genoma da cana-de-açúcar, entre outros.

Projetos já utilizados na prática, e em desenvolvimento, voltados à sanidade da agropecuária, revelam como a biotecnologia está e poderá ser utilizada nessa área do conhecimento. A produção de bioinseticidas, capazes de controlar pragas e doenças, já transformou o Brasil em importante pólo produtor e exportador dessa tecnologia, inclusive permitindo ao País abrigar alguns dos maiores programas mundiais de controle biológico.

Ressalta-se a grande repercussão nacional e internacional do programa de controle biológico da cigarrinha-da-cana-de-açúcar através do fungo Metarhizium anisopliae. Somente no Estado de São Paulo, na safra 2006/2007, foram utilizados 750 toneladas do fungo em uma área de 250.000 hectares, com economia no manejo da praga de R$ 22 milhões. Do ponto de vista ambiental, 200 toneladas de agrotóxicos deixaram de ser utilizados no canavial. Existem atualmente no Brasil 52 biofábricas.

A produção de vacinas e antígenos é outra linha de fundamental importância, para implementação dos programas sanitários, assegurando a proteção dos rebanhos brasileiros. Novas técnicas de diagnóstico animal e vegetal fortalecem a segurança sanitária e fitossanitária nacional contra a introdução de doenças e pragas que não existem no País. Nesse sentido, o emprego de técnicas avançadas, como é o caso do código de barras do DNA, transformou-se em importante aliado da agricultura brasileira para o combate aos nematóides (parasitas) que chegam com sementes importadas.

Mais completo e confiável do que os testes tradicionais realizados por meio da morfologia da praga, o método começou a ser realizado este ano pelo Laboratório de Nematologia do Instituto Biológico. O local é o primeiro no Brasil a usar a técnica para este tipo de problema que atinge o agronegócio. Várias outras doenças de importância econômica têm no diagnóstico molecular ferramenta altamente confiável para expressar os resultados, considerando segurança e rapidez.

Líder de pesquisa na área de desenvolvimento de biocombustíveis (etanol), o Brasil mostra ao mundo capacidade de oferecer solução tecnológica limpa para a adequação da matriz energética através de uma ótima fonte de energia renovável. O desafio agora é usar biotecnologia para retirar etanol do bagaço e da própria biomassa da cana através de reações catalisadas por diversas enzimas conhecidas na natureza.

Entramos na era da agricultura de base biotecnológica e as consequências ainda não podem ser imaginadas em sua real extensão. Contudo, é importante considerar que a biotecnologia traz benefícios e riscos, cabendo a sociedade escolher o uso que quer fazer com o avanço do conhecimento.
Antonio Batista Filho
Diretor do Instituto Biológico (IB-APTA-SAA)

Terras já começam a cair de preço

A notícia abaixo publicada na Folha de São Paulo mostra que as terras, após um grande crescimento, começam a cair de preços. Será um sinal da crise ou um ajuste necessário?

PREÇO MÉDIO DO HECTARE CESSA TRAJETÓRIA DE ALTA

Mercado que registrava sucessivos recordes desde o ano passado, o comércio de terras no país vive agora, neste semestre, uma nova fase, de procura menos aquecida. Segundo Jacqueline Bierhals, analista da consultoria AgraFNP, o preço do hectare se estabilizou. "Na alta, mas se estabilizou."

A AgraFNP realiza bimestralmente avaliação sobre o mercado de terras. Novos números devem ser divulgados hoje. Bierhals antecipa que a variação deve ser mínima -"alta de R$ 4, R$ 5".

Os dados mais recentes apontam para preço médio de R$ 4.341 para o hectare no país. No fim do primeiro semestre, o preço estava em R$ 4.287. "A velocidade no aumento de preços sumiu."

Segundo Bierhals, a estabilidade nada tem a ver com a expectativa de que o governo limitaria a compra de terras por estrangeiros. O motivo foi a redução do preço dos produtos agrícolas. Um exemplo: do pico de pouco mais de US$ 16 o bushel na Bolsa de Chicago em julho, a soja desceu para US$ 9.

Ela diz que o mercado de terras costuma ter respostas mais lentas em relação a outros setores. "Quando o valor sobe, não dispara do dia para noite, como na Bolsa. Quando cai, também não despenca de uma vez."

Nos últimos meses, o comércio de áreas de aptidão agrícola enfrenta estagnação. A crise de liquidez na economia, acentuada desde a metade de setembro, fez muitas negociações serem interrompidas ou adiadas. Para ela, a tendência é os preços da terra começarem a recuar. Mas o movimento não deve ser tão intenso quanto o da crise do início da década, quando o hectare perdeu metade do valor.

A analista considerou sensata a determinação do governo à AGU de não haver restrição a investimentos do exterior em terras. Um caso, em especial, seria muito difícil de fiscalizar -o de empresas brasileiras de grande porte com injeção de capital estrangeiro. "Como determinar o que é dinheiro nacional e o que vem de fora?"

terça-feira, novembro 18, 2008

STF acaba com a "festa" sobre legislação municipal de queima de cana

Demorou mas o STF, conforme podemos ler na notícia abaixo publicada hoje pela Folha de São Paulo, proibiu as cidades de legislar sobre a queima da cana-de-açúcar para colheita. Muitos municípios, através de seus vereadores, legislavam sobre o assunto proibindo a queima na área do município.

A eliminação da queimada não pode ser realizada de uma forma brusca como pensam os nobres vereadores que se aproveitam da comoção do tema para ganhar votos.

Na minha opinião, o protocolo agroambiental assinado entre a UNICA e o Estado de São Paulo é a melhor forma de resolver este problema. Para quem deseja conhecer melhor este protocolo, clique aqui:

STF PROÍBE CIDADE DE LEGISLAR SOBRE QUEIMA DA CANA

O STF (Supremo Tribunal Federal) concedeu liminar que proíbe a cidade de Paulínia de legislar sobre a queima da palha da cana-de-açúcar. A decisão poderá criar jurisprudência e estender a proibição às cidades paulistas com leis semelhantes, o que pode atingir Barretos e outros três municípios.A decisão, da última sexta-feira, atende a recurso movido pela Unica (União da Indústria da Cana-de-Açúcar). O ministro do STF Eros Grau suspendeu a decisão do Tribunal de Justiça de SP, que julgou improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta contra a lei de Paulínia. Barretos, São José do Rio Preto, Limeira e Americana possuem leis contra a queima -a de Barretos vale a partir do ano que vem.

quinta-feira, novembro 13, 2008

Palestra sobre o BRIC e as commodities

Encontrei no site do Bradesco Rural, uma palestra de abril de 2008 que mostra a influência dos países BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) na economia mundial e nas commodities. Apesar da palestra ser de antes da crise, tem muito dados interessantes lá.

O acesso à palestra pode ser feito através do filme (clicando aqui) ou dos slides em PDF (clicando aqui).

Segundo análise do Bradesco, somente carne terá bom 2009

Em nota publicada no blog Mundo Agro da Exame, capitaneado por Fabiane Stefano, podemos observar que o Bradesco fez uma análise não muito boa para o ano de 2009 para as commodities agrícolas. Na sequência, texto integral da nota que também pode ser encontrado diretamente no Portal Exame, clicando aqui:

A carne não é fraca

O Bradesco divulgou nesta semana um amplo relatório de tendências setoriais para 2009 no qual são atualizados prognósticos feitos em maio de 2008. No agronegócio, foram analisados 14 produtos agropecuários. E o cenário geral não é animador. Embora o relatório aponte que os preços internacionais permaneçam acima da média histórica, os fatores de risco para o agronegócio são muitos. Aumento de custos, margens reduzidas, redução da oferta de crédito e volatilidade cambial justificam a revisão de boa parte dos cenários de "favorável" para "desfavorável". Nessa situação estão as lavouras de soja, milho, trigo, algodão, arroz e feijão. O que chama a atenção é que, entre tantos prognósticos negativos, as projeções para as cadeias de bovinos, suínos e aves se mantêm favoráveis. Os três segmentos - grandes exportadores - são amplamente beneficiados pela desvalorização do real, pois receberão mais reais pela mesma mercadoria. No caso de suínos e aves, a queda dos preços da soja e do milho implica a redução de custos - o que é uma ótima notícia em épocas de aperto. É provável que o setor brasileiro de carnes também venha a sentir os efeitos de uma demanda mundial mais fraca - assim como boa parte dos produtores de commodities. Mas isso deverá ser compensado pela forte competitividade que o país tem na produção de proteína animal. Em horas de crise, só os mais fortes tendem a ganhar mais espaço no mercado.

Por Fabiane Stefano
Publicado em 12/11/2008 - 17:14

Plantio no MT mostra os sinais da crise

Notícia do Valor Econômico de hoje mostra como está sendo realizado atualmente o plantio da safra de grãos no Mato Grosso e suas consequências:

Sementes de uma safra de incertezas
Patrick Cruz, de Alto Araguaia (MT)

O trator da foto ao lado anda a uma velocidade de 5 quilômetros por hora. Sua plantadeira abre 13 fileiras de sulcos na terra, distantes 45 centímetros uma da outra, nas quais vai largando as sementes de soja que mais uma vez atestarão Mato Grosso como o maior produtor da oleaginosa do país. A soja, por sua vez, é o principal produto de exportação do agronegócio brasileiro. Sozinha, uma reles semente conta a história de uma safra personificada pelas unhas roídas dos agricultores.

A semente foi ao solo já de cabeça baixa. Na safra 2008/09, a produtividade esperada para a cultura em Mato Grosso deverá ser menor que a da temporada 2007/08. Muito por culpa do adubo - ou da falta dele. O preço dos fertilizantes oscila conforme os humores da cotação do petróleo, que atingiu picos históricos no terceiro trimestre, quando as compras de insumos para a safra são feitas. O petróleo despencou desde então, mas o peso para o produtor permanece, já que a taxa de câmbio entre real e dólar subiu - a maior parte do mercado é abastecido com fertilizantes importados.

Para uma produtividade de 50,75 sacas de soja por hectare - abaixo da média de 52,4 sacas da safra 2007/08 -, os custos em Mato Grosso ficam entre R$ 650 a quase R$ 800, a depender do pólo de produção do Estado, segundo cálculos do Instituto Mato-grossense de Economia Agrícola (Imea). Menos fertilizante, mais reza para São Pedro. Que a chuva fique nos conformes e ajude a compensar, ao menos em parte, a diminuição do uso de adubo.

Ao menos nisso, um alento. O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) prevê chuvas regulares para todo o Centro-Oeste em novembro, dezembro e janeiro, o que favorece a agricultura. Para Mato Grosso, nesses três meses, são esperados 900 milímetros de precipitações, volume bastante satisfatório para essa época do ano e, é claro, para a lavoura.

Lá vai o trator, lá vai a semente. E vão com atraso. No Centro-Oeste, em outubro, houve acúmulo de 40 milímetros de chuvas, volume bastante inferior à média histórica para o mês, de 170 milímetros. Depois das chuvas habituais do período entre o fim de setembro e o começo de outubro, com o solo mais úmido, é que a semeadura se acelera.

O atraso da descida da semente ao solo ocorreu menos pela demora da chuva em alguns pólos de produção e mais pela oferta modesta de crédito aos agricultores. Seja pela crise global, seja pela oscilação vertiginosa do preço da soja no mercado internacional, que tornou fosco o cenário para o cálculo de custos e projeção de margens, os financiadores ficaram mais arredios. Levantamento realizado em julho pela consultoria Agroconsult mostrou que, em Mato Grosso, as tradings financiarão 34% do custeio total da safra de soja do Estado. Em 2007/08, essa fatia foi de 53%.

O produtor Olívio Frick fala por si, por suas sementes e pelas de todo o Mato Grosso. Em Alto Araguaia, no sudeste do Estado, cultiva soja em 2,5 mil hectares. Na primeira semana de novembro, havia semeado em apenas 300 hectares, um contraste com a safra 2007/08, quando, nessa mesma época, o plantio em sua área já estava praticamente concluído.

Segundo ele, não será possível concluir a semeadura ainda nesta primeira quinzena de novembro - lavouras de Mato Grosso plantadas até o dia 15 costumam ser as de melhor produtividade. "Estou pensando em quitar dívidas e, no futuro, largar a lavoura. É uma pena", afirma, para, ao questionar, argumentar: "Mas o que se há de fazer?" Na vida acadêmica, suas duas filhas optaram pelas carreiras de medicina e direito. "Uma delas queria seguir a agricultura, mas por mim, e não por ela. Mas, se é só por mim, que não faça. É melhor".

Frick partiu do Rio Grande do Sul natal e chegou a Mato Grosso no dia 21 de agosto de 1976, um sábado. "Na quarta-feira eu já tinha um trator", lembra. "No tempo daquele alemão [o ex-presidente Ernesto Geisel] a coisa era mais fácil", fala ele em sua lógica própria. "A gente tinha calcário para jogar até nas pedras".

O calcário, mineral usado para corrigir a acidez do solo, já estava no campo quando, com atraso, o trator iniciou sua jornada (aos 5 quilômetros por hora, uma semente de quando em quando, 13 sulcos distantes 45 centímetros um do outro). Sobre o trator e no apoio, mão-de-obra que custa, na média, R$ 13,58 por hectare em Diamantino, um dos pólos da sojicultura de Mato Grosso, e R$ 22,92 em Sorriso.

A semente que o trator libera custaria R$ 60,55 por hectare no município de Sorriso e R$ 115,50 em Sapezal, em cálculos que têm sempre como parâmetro uma produtividade de 50,75 sacas por hectare. Semente que tem demanda firme, apesar dos pesares, de acordo com a Associação Brasileira de Sementes e Mudas (Abrasem). Seu consumo deverá crescer 20% neste ano, segundo a entidade. O volume de 2007 foi de 950 mil toneladas.

Dos insumos, a compra de defensivo - ou "veneno", para os íntimos - costuma sempre ocorrer depois. Os levantamentos trimestrais feitos pelo Instituto de Economia Agrícola (IEA) vinham atestando queda na chamada relação de troca - paulatinamente caiu o número de sacas de soja necessárias para comprar o "coquetel" usado na lavoura. O preço do glifosato, herbicida largamente usado nas plantações, em contrapartida, subiu - e, como no caso do adubo, também na cauda do petróleo. O petróleo caiu, mas, com a valorização do dólar, o glifosato em particular e os defensivos em geral, quando importados, tendem a ficar mais caros.

Lá vai o trator, lá vai a semente. "Dá até um desânimo", diz o técnico agrícola de prenome Reginaldo. "A coisa está difícil este ano". Ao discorrer genericamente sobre os empecilhos da safra, fala de fertilizante, de plantio atrasado. Suas entrelinhas, contudo, falam de bolsa de Chicago, de contratos futuros, de margem de comercialização, de fundos de hedge - que incharam o volume de negócios na busca por rentabilidades que estavam acima das obtidas na compra e venda de outros ativos, como ações de empresas - e o estouro da inflação das commodities agrícolas, do famigerado gargalo logístico no escoamento da produção agrícola brasileira.

O lacônico "dá até um desânimo" também se explica pelo ritmo moroso das vendas da soja. A comercialização antecipada da oleaginosa é um dos caminhos para o produtor financiar seu plantio, mas a ferramenta não apresenta na safra 2008/09 o vigor do ciclo anterior. Primeiro, os financiadores recusaram-se a acertar a compra de soja quando, no início do semestre, seu preço superou os US$ 16 por bushel (medida que equivale a 27,2 quilos) na bolsa de Chicago, referência para a formação de preços.

Veio a crise global, veio o tombo da soja. Como os custos dos produtores subiram de uma safra a outra, e como a cotação do grão recuou, eles é que agora aguardam o momento de efetuar as vendas, à espera de preços melhores. Balanço da Agência Rural apontou que, até agosto, 16% da produção prevista para o país já havia sido comercializada. Na mesmo época de 2007, a venda já havia chegado a 38%.

A alta do dólar pode encarecer os insumos importados. Por outro lado, tende a elevar a receita com as exportações. No câmbio de R$ 1,80 de setembro, conseguiria-se US$ 338,98 por tonelada com o embarque ao exterior da soja que parte de Sorriso, segundo o Instituto Mato-grossense de Economia Agrícola. Os produtores esperam que a alta do dólar ajude a compensar os percalços do caminho.

Tome-se o cenário hipotético de custos e receitas do pólo de Diamantino. A receita por hectare calculada pelo Imea em setembro era de US$ 752,49 por hectare. Os custos variáveis (sementes, defensivos, fertilizantes, mão-de-obra capital de giro, armazenagem), por seu lado, chegavam a US$ 943,05 para uma produtividade esperada de 50,75 sacas por hectare. Rentabilidade negativa de 20% sob esse cenário. Os números variam para mais ou para menos a depender da localização do município - muito por conta do maior ou menor gasto com o óleo diesel do transporte da carga -, mas o fio da meada é o mesmo.

Petróleo, fundos de hedge, chuva, oscilação do câmbio e das commodities agrícolas, vendas antecipadas, crise global, encarecimento do veneno, "dá até um desânimo", comércio exterior. Uma semente não é só uma semente. Mas lá vai o trator.

sexta-feira, novembro 07, 2008

Apesar da crise, safra mundial de grãos bate recorde

Na mesma edição de hoje do Valor Econômico que comenta a queda na safra brasileira de grãos, foi publicada a reportagem abaixo que aponta, segundos estudos da FAO, para uma produção recorde de graõs no mundo com a oferta superando a demanda:

Oferta global de cereais vai superar a demanda em 2008/09, prevê FAO

A produção mundial de cereais deverá alcançar 2,242 bilhões de toneladas na temporada 2008/09, conforme estimativa divulgada na quinta-feira pela FAO, braço da ONU para agricultura e alimentação. A safra está em fase de colheita no Hemisfério Norte e de plantio abaixo da Linha do Equador - inclusive no Brasil. Se confirmado, o volume projetado será 5,3% superior ao do ciclo 2007/08 e marcará um novo recorde histórico.

Em comunicado, a FAO destaca que, pela primeira vez nos últimos quatro anos, sua projeção para a produção é mais do que suficiente para atender à demanda prevista, uma vez que em 2007/08 o "superávit" foi marginal (ver quadro). Reflexo desse quadro mais confortável é a estimativa da agência da ONU para os estoques finais mundiais, que, tudo indica, também deverão aumentar.

A demanda total ao longo da temporada 2008/09 foi calculada em 2,197 bilhões de toneladas, 3,3% mais que na safra passada. Trata-se de um percentual de crescimento menor que o projetado para a produção, e esse descasamento resultou em estoques finais globais de 474 milhões de toneladas no ciclo atual, 9,4% maior.

Em tempos menos contaminados pelas movimentações financeiras nos mercados de commodities, a confirmação das previsões da FAO - que, em grande parte, dependerá do comportamento do clima no Hemisfério Sul nos próximos meses - significaria uma tendência de preços mais baixos dos alimentos pelo menos até o primeiro trimestre do próximo ano, e esta é uma grande preocupação desse braço das Nações Unidas.

Em 2007/08, a disparada das cotações de produtos como trigo, soja, milho e arroz no mercado internacional, que atingiu o ápice no primeiro semestre deste ano, elevou o número de pessoas subnutridas no mundo para cerca de 923 milhões. A recente queda de preços nas bolsas, diz a FAO, ainda não chegou aos consumidores da maioria dos países.

No longo prazo, alerta, a agricultura global enfrentará grandes desafios cujas soluções precisam começar a ser desenvolvidas agora. Haverá menos terras e água disponíveis, menos investimentos em infra-estrutura rural e pesquisas agrícolas, aumento de custos de produção e mudanças climáticas. É neste cenário que mais de 9 bilhões de pessoas terão de ser alimentadas até 2050, conforme as projeções atuais, e para isso a oferta terá mais do que dobrar.

Custos maiores fazem safra 2008/2009 ser menor do que a anterior

Nesta safra, devido principalemente aos custos elevados e menor utilização de tecnologia, o resultado será menor quando comparado à safra anterior. Leia na sequência reportagem do Valor Econômico de hoje que fala sobre o assunto:

Conab vê colheita menor e programa intervenções

Afetada pela explosão nos custos de produção e pela falta de crédito barato, sobretudo na região Centro-Oeste, a nova safra de grãos, fibras e cereais será menor do que previa inicialmente o governo. Na média das previsões divulgadas ontem pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a colheita total deve recuar para 140,75 milhões de toneladas, um resultado 2,2% inferior ao recorde histórico de 143,82 milhões de toneladas registrado no ciclo anterior. A área plantada deve registrar expansão de até 1,2%, para 47,95 milhões de hectares.

Embora trabalhe com dois cenários para a produção na campanha 2008/09, um mais otimista que prevê 141,83 milhões de toneladas (queda de 1,4%) e outro mais pessimista, estimado em 139,65 milhões (- 2,9%), há um consenso nas previsões da Conab: a necessidade de intervenção do governo na comercialização da safra, a partir de fevereiro de 2009, como forma de evitar uma queda abrupta nos preços ao produtor durante o auge da colheita.

Entre subsídios diretos "na veia" e ações de sustentação de preços, a Conab tem reservados R$ 1,5 bilhão para comprar até 6,65 milhões de toneladas de grãos, fibras e cereais. Os planos da Conab incluem o uso de R$ 470 milhões para sustentar as cotações de algodão, outros R$ 353 milhões para apoiar a comercialização de 2,66 milhões de toneladas de milho e R$ 175,5 milhões para auxiliar 1,5 milhão de toneladas de trigo.

Também há R$ 180 milhões para apoiar 1,5 milhão de toneladas de arroz e R$ 5 milhões para 100 mil toneladas de feijão, além da previsão de R$ 318 milhões para enxugar até 190 mil sacas de café no mercado. Para a soja, mesmo com os problemas de falta de financiamento de tradings e fornecedores de insumos, nada está previsto. "Queremos garantir renda ao produtor com o menor impacto possível sobre os preços ao consumidor", resume o diretor de Logística da Conab, Sílvio Porto.

O governo também reservou R$ 2,3 bilhões para promover a aquisição direta de 5,9 milhões de toneladas de vários produtos e garantir a recomposição dos estoques públicos de passagem, usados em épocas de combate à inflação. A Conab estima comprar 4 milhões de toneladas de milho a um custo total de R$ 940,1 milhões e 1,65 milhão de toneladas de arroz com R$ 825,5 milhões.

Também prevê gastar R$ 80,7 milhões na aquisição direta de 100 mil toneladas de feijão; R$ 73,4 milhões na compra de 24,7 mil toneladas de algodão; e R$ 50,3 milhões com 135 mil toneladas de trigo.

A previsão de safra divulgada ontem pela Conab mostra que a produção do Centro-Oeste sofrerá os maiores impactos da crise de crédito iniciada com a saída do mercado de tradings e fornecedores de insumos, tradicionalmente os maiores financiadores do setor na região. A redução da área plantada ficaria entre 1,7% e 3,4%, segundo a Conab. A produção recuaria de entre 5,5% a 7,3% - de 46,73 milhões até 47,64 milhões de toneladas. "A soja tem a maior relação com a retração das tradings e dos bancos privados, mas o governo dará um apoio na comercialização", afirma Sílvio Porto. "Não tenho dúvidas de que teremos que entrar no mercado".

Mesmo com as previsões sombrias, a Conab ainda guarda um otimismo com o futuro da nova safra. A origem está na elevação de 4,1% nas entregas de fertilizantes até setembro deste ano. Em Mato Grosso, o crescimento foi de apenas 3,5%, mas os produtores de Goiás compraram 9,5% mais adubos no período. "É um reflexo da ação das tradings. Mas ainda é um cenário altamente positivo. Não é apologia, mas dados que nos permitem fazer essas projeções", afirma o diretor.

Em sua previsão, a Conab estimou recuo na produção de soja, de 60 milhões de toneladas para até 58,39 milhões, a depender do cenário. Para o milho, a colheita deve ficar entre 54,3 milhões e 55,2 milhões de toneladas.

terça-feira, novembro 04, 2008

Crise não abala consumo de carnes

Em notícia publicada hoje no Portal Exame, a Reuters informa que o JBS Friboi avalia que a demanda de carnes não caiu com a crise e continua forte:

JBS vê consumo de carne firme e foca oportunidades no Mercosul
Por Roberto Samora

SÃO PAULO (Reuters) - O brasileiro JBS, grupo que mais abate bovinos no mundo, com operações nos Estados Unidos, Europa, América do Sul e Austrália, avalia que a demanda por carne continuará firme, apesar da crise global, e prevê crescer mais suas operações em 2009, focando especialmente o Mercosul.

"Verificamos que nos últimos anos, em todas as crises, se houve redução no consumo em tonelagem, não houve grandes oscilações", afirmou o presidente do JBS, Joesley Mendonça Batista, em entrevista à jornalistas.

Embora avalie que tanto o volume abatido quanto o consumido deva variar pouco nos próximos três a quatro anos, uma vez que a oferta no ciclo da pecuária é "inelástica", ele admitiu que o preço, "de fato", pode oscilar, sem dar mais detalhes.

No terceiro trimestre de 2008, a empresa abateu 2,95 milhões de cabeças de bovinos, aumento de 22,2 por cento em relação ao mesmo período de 2007 e alta de 2,4 por cento ante o segundo trimestre deste ano.

Batista disse ainda que vê nos momentos de turbulência financeira oportunidades para crescer. "Temos conseguido produzir resultados nos mais adversos cenários, de farta liquidez ou de falta de liquidez... Temos DNA de crescer e tenho certeza que vamos continuar crescendo", afirmou ele.

Entretanto, ele indicou que a empresa não pretende realizar novas aquisições em 2008, aguardando algum "tempo para entender o aperto de liquidez". "Em 2008 não vamos fazer nada, estamos preparados para seguir crescendo em 2009, no Mercosul", observou o presidente, destacando que a empresa tem recursos suficientes em caixa. Empresas com problemas financeiros no Brasil e Argentina poderão ser os alvos.

CÂMBIO E EUA REFORÇAM LUCRO

No final da noite de segunda-feira, o JBS divulgou o seu melhor resultado trimestral da história, que atingiu no terceiro trimestre 694 milhões de reais, contra prejuízo de 78,3 mmilhões de reais na mesma época do ano passado e perdas da ordem de 364 milhões de reais no segundo trimestre do ano.

Parte da diferença no lucro veio, segundo Batista, da valorização dos ativos da empresa no exterior, com a alta do dólar frente ao real, e também das operações de hedge para proteger a empresa de tais variações do câmbio --anteriormente, a empresa registrara prejuízos, sem efeito caixa, justamente pelo movimento contrário da moeda brasileira.

Segundo Batista, a empresa, com 80 por cento de sua geração de caixa na moeda norte-americana, ainda não foi beneficiada no operacional pela valorização do dólar, o que deve ocorrer com maior força no quarto trimestre.

De qualquer forma, ele destacou o resultado expressivo das operações de bovinos do JBS EUA, cujo Ebitda (ganhos antes de juros, impostos, depreciação e amortização) subiu 1.441,6 por cento em relação ao terceiro trimestre de 2007, para 155,6 milhões de dólares, um recorde.

"A Swift dos EUA (atual JBS) experimentava resultados inferiores ao da indústria. Um ano depois, operamos acima da mediana", salientou Batista, lembrando que enquanto as vendas externas totais norte-americanas cresceram 33 por cento este ano, as do JBS aumentaram em 64 por cento.

FORÇA PARA BRIGAR NOS EUA

Durante o terceiro trimestre, o governo dos EUA aprovou uma das aquisições do JBS, a unidade de carne bovina do grupo Smithfield e suas operações de confinamento, negócio este já finalizado. Mas o JBS afirmou que continuará tentando na Justiça dos EUA a aprovação da National Beef, cuja compra foi anunciada em março, juntamente com o negócio da Smithfield, mas bloqueada pelo Departamento de Justiça.

"Temos um projeto de longo prazo... (A National Beef) é relevante para o aumento de nossa competitividade, para brigar com as gigantes dos Estados Unidos, como Cargill e Tyson. Temos que ter tamanho equivalente para disputar com as gigantes."

Entrevista com o ex-ministro Roberto Rodrigues

O ex-ministro Roberto Rodrigues deu uma entrevista ontem à Gazeta Mercantil onde comenta como a crise pode trazer boas oportunidades para o agronegócio brasileiro. Abaixo a entrevista:

TODA CRISE CRIA OPORTUNIDADES, DIZ EX-MINISTRO ROBERTO RODRIGUES

Da "bolha econômica" furada pela concordata do Lehman Brothers ainda escorre o crédito, ou a escassez dele, que já não sacia mais o apetite do agronegócio brasileiro. Problema que para o ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues já havia se instalado antes mesmo do fatídico 14 de setembro, que marcou a quebra da instituição financeira americana e o início da atual crise mundial.

O coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e presidente do Conselho Superior de Agronegócios da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), é capaz até de prever o "pior dos mundos", sem, no entanto acreditar nele.

Escassez de crédito, descapitalização do setor produtivo - e a conseqüente perda da capacidade de investimento -, endividamento, inflação, perda da capacidade de exportação e o inevitável desmanche do superávit da balança comercial. Essas seriam conseqüências que a economia brasileira poderia experimentar caso não aproveitasse as oportunidades geradas pela crise e já avistadas por Rodrigues.

Segundo ele, "toda crise gera também oportunidades", para aproveitá-las bastaria criar e administrar os instrumentos de regulação adequados. Um deles seria a política de "preços mínimos", prevista em lei e, de acordo com o ex-ministro, capaz de trazer à balança comercial brasileira do agronegócio, mercados que certamente serão abandonados pelos países desenvolvidos em decorrência do atual momento econômico, - solução que passa pela garantia de viabilidade da safra 2010. Garantia essa que só poderia ser conquistada mediante a liberação de crédito rural, recurso oferecido pelo governo federal e pela força de medidas, mas que não consegue atravessar com tanta facilidade o caminho dos bancos para alcançar o produtor agrícola.

Em entrevista à Gazeta Mercantil, Roberto Rodrigues aponta a direção a ser seguida pelo crédito e pelo governo para que o País encontre o atalho da maior crise financeira dos tempos modernos.

Gazeta Mercantil - Qual a conseqüência imediata dessa retração de crédito agravada pela crise econômica?

Estamos diante de uma safra cara e com menos crédito, seja por problemas anteriores e nacionais, seja por problemas agravados por causa da crise. Esse fato tem dois reflexos naturais, o primeiro é uma redução da área plantada. A expectativa que se tinha de crescimento já está sendo desmanchada, tanto é verdade que o setor de fertilizantes que teve o melhor primeiro semestre da história, tem um dos piores segundos semestres, houve então uma reversão das expectativas. A outra questão é a redução do padrão tecnológico.

Como o crédito está muito mais caro, o agricultor acaba usando menos tecnologia e restringe o horizonte produtivo lá na frente. Isso já é dado, já aconteceu. O que ainda pode acontecer é um desânimo dos produtores em relação à safra que vai ser plantada em 2009.

Gazeta Mercantil - Esse desânimo é generalizado? Como essa redução de área cultivável vai impactar na relação oferta/demanda?

Os países desenvolvidos vão provavelmente diminuir o plantio e ficar pedalando a safra porque terão "target price" (preço mínimo). Isso significa uma menor oferta de produtos agrícolas para 2010. Ano que vem já está garantido, não tem mais o que discutir. Na hipótese, que eu considero pouco provável, de os preços caírem durante a colheita da nossa safra a partir de março, nós viveríamos o pior dos mundos.

Teríamos uma safra cara com pouco crédito, baixa produtividade e preços ruins. E se isso acontecesse, haveria uma brutal descapitalização do setor, perda de capacidade de investimento e endividamento. Ficaríamos com uma reduzida capacidade de plantar a safra em 2009 de modo que no ano seguinte teríamos uma safra pequena no Brasil, somada à uma safra pequena no hemisfério norte.

Essa situação levaria à uma inflação de alimentos e uma redução na capacidade de exportação desmanchando nosso superávit comercial. Seria um desastre para o País.

Gazeta Mercantil - E como evitar esse desastre por aqui?

Precisamos transformar o risco em oportunidade, e esse instrumento já existe. Há uma lei no dos anos 70 chamada PGPM - política de garantia de preços mínimos -, é uma lei que permite que o governo interfira caso o mercado pratique um preço abaixo daquele estabelecido pelo governo, seja comprando, seja financiando a estocagem, seja pagando a diferença entre o preço de mercado e o preço mínimo de garantia. Precisamos fazer um recálculo desses preços com base no comportamento do mercado nos últimos dias, e ainda colocar no orçamento do ministério da Agricultura recursos orçamentários suficientes para executar a política de preços mínimos.

Gazeta Mercantil - Isso aceleraria o processo de viabilização de crédito?

A aventura acabaria porque o produtor sabe que vai plantar com garantia que vai receber um preço mínimo lá na frente. Os bancos perdem o medo do risco porque esse preço mínimo também é garantia de retorno de investimentos. É hora do governo ressuscitar um instrumento que já existe por lei e basta decisão política e obviamente econômica. Se isso acontecer o governo dará ao País uma oportunidade formidável de em 2010, com uma safra boa, ocupar mercados que serão perdidos por outros países. E o governo está sendo muito ativo no processo. A Câmara dos Deputados já está analisando o orçamento para voltar a praticar a política de preços mínimos. Esse é um cenário onde a crise pode ser transformada em uma grande oportunidade para a agricultura e para o Brasil. Mas, além disso, tem um outro problema ainda mais emergencial que são os ACC’s (Adiantamento de Contrato de Câmbio).

Gazeta Mercantil - Como garantir à indústria do agronegócio o fluxo das exportações, e à balança comercial brasileira o peso da receita que vem do mercado internacional?

O governo tá prometendo resolver isso (o problema dos ACC’s) rapidamente via BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Social), mas existem alguns setores que já estão estrangulados, um deles, o mais estrangulado, é o setor sucroalcooleiro. As usinas que exportam açúcar e álcool não estão conseguindo financiamento para exportação e não podem pagar os produtores de matéria-prima, com isso a renda rural vem sendo represada lá atrás, o que tem um efeito dominó muito negativo sob as regiões canavieiras. Este problema por enquanto está restrito à área canavieira, mas já se aproxima dos frigoríficos, do suco de laranja e de qualquer outro segmento agroindustrial que esteja alavancado em dólar. A alocação de recursos de ACC’s é absolutamente indispensável para destravar a questão da renda rural nas cadeias produtivas que dependem da industrialização.

Gazeta Mercantil - A agricultura brasileira viveu uma crise em 2004 e agora, quatro anos depois, já enfrenta uma nova turbulência. Esse curto período de alta não foi suficiente para o produtor se recuperar. Como o governo deve intervir nessa situação de endividamento explícito?

O governo encaminhou uma solução de rolagem dessa dívida, mas o assunto não foi encerrado ainda, e é por isso que uma parcela de produtores que tinham dívidas e não puderam rolar essas dívidas perderam acesso ao novo crédito. Aí entra a burocracia pública, que inibe a rapidez do processo, que por sua vez se cristaliza.

Gazeta Mercantil - Qual a real capacidade de crescimento da agropecuária brasileira?

380 milhões de toneladas de grãos é o número limite da nossa capacidade de produção e não há tempo limite para chegar lá, pode demorar 50 ou 15 anos. Temos um crescimento potencial horizontal para dobrar a área. Nós temos hoje 72 milhões de hectares cultivados e outros 96 milhões de hectares ocupados com pastagem perfeitamente agricultáveis. Além disso existe a possibilidade de crescimento vertical. A produtividade média de milho no Brasil hoje é de 72 sacas por hectare, mas os campeões do Paraná chegam a 200 sacas.

Gazeta Mercantil - E como essa produção brasileira vai abastecer o mercado externo?

Nos últimos sete anos, a produção mundial de grãos foi 120 milhões de toneladas menor do que o consumo, ou seja, houve um déficit. E o Brasil nesse período teve um superávit de 160 milhões de toneladas.

Se não fôssemos nós esse déficit global seria de quase 300 milhões de toneladas. Então o Brasil já vem sendo um País diferenciado nesse cenário global. Em termos de mercado, avançamos mais em relação aos países em desenvolvimento, os emergentes, porque a renda per capita deles cresce mais que a renda per capita dos países desenvolvidos, e a população também. Nos mesmo sete anos, nós tivemos um crescimento ao ano de 11% das exportações para os países desenvolvidos - o dobro da média mundial -, mas para os países emergentes nós exportamos 21% a mais. Então temos um potencial que poucos têm de conquistar esse mercado, mas para isso nós temos que cuidar da renda rural através de instrumentos de crédito adequados, temos que ter uma logística melhor. Nós estamos sucateados em termos de rodovias, ferrovias, portos. Temos que fazer investimentos vigorosos e o PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) está aí para isso. Temos que fazer a promoção comercial e acordos bilaterais para abrir mercados.

Gazeta Mercantil - Como deve se comportar a demanda mundial, tanto por proteína animal, quanto por grãos? E os preços?

Todas as previsões são de um crescimento da demanda mundial por proteína animal e por oleaginosas, bem como frutas e legumes, e uma redução de raízes, tubérculos e cereais não protéicos. Essa é uma tendência irrecorrível. Se você olhar para o mercado mundial agrícola vai ver que os preços têm uma ciclotimia sistêmica determinada pela oferta e demanda, porém a resultante dessa ciclotimia é uma tendência permanente declinante de preços. Isso porque a tecnologia aumenta a oferta, e se a demanda não aumentar na mesma direção os preços sistematicamente caem, razão pela qual eu questiono o discurso de que teria acabado o tempo dos alimentos baratos. Isso está errado, os preços tendem a cair. O que acontece hoje é um movimento de demanda superior à oferta determinado pela renda crescente nos países em desenvolvimento. Com a crise passou a haver uma pressão sobre essa demanda que poderá determinar uma redução do consumo dos produtos de maior valor agregado como a carne, mas é uma curva da crise, tanto pode ser para baixo da tendência ou para cima, mas ela é sempre declinante, de forma que em qualquer circunstância essa curva será superada por outra curva. Tendência essa que continuará no longo prazo. Vales ou picos de preços, e também a demanda de consumo, fazem parte dessa resultante.

Gazeta Mercantil - E sobre as novas fronteiras agrícolas?

Os eixos de avanço da agricultura são suportados pela logística. Quando eu era ministro, o Maranhão tinha uma logística desenhada e vantagens tributárias dadas pelo governo de lá em relação ao ICMS.

Hoje, no Piauí tem uma logística interessante, indústrias estão indo para lá fazer a moagem na região. Então o que vai determinar esses eixos de crescimento em direção às novas fronteiras é a logística, que hoje ainda consome 20% do PIB brasileiro.

segunda-feira, novembro 03, 2008

Projeções otimistas do Ministério da Agricultura para 2018/2019

Foi divulgada semana passada, as projeções do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento para a safra 2018/2019. Com base nestas informações, a blogueira Fabiane Stefano do Blog Mundo Agro da Exame publicou o post abaixo e ainda na sequência temos uma figura publicada na Exame mostrando outros dados interessantes sobre a competitividade do agronegócio brasileiro publicados na última edição:

Otimismo versus otimismo
O Ministério da Agricultura acabou de lançar uma série de projeções para o agronegócio brasileiro nos próximos dez anos.

O trabalho analisa 18 produtos agrícolas. Com exceção do algodão, que permanecerá estável, todas as outras culturas terão aumentos expressivos de produção até 2018.

Os destaques ficam para o etanol (que passa de 22 bilhões para 59 bilhões de litros) e para o frango, a carne bovina, o trigo e o açúcar, com crescimentos de 57%, 49%, 46% e 44%, respectivamente.

O desempenho do agronegócio tem sido alvo de estudos de longo prazo - especialmente quando se trata de duas das principais commodities agrícolas: a soja e o milho.

A Agroconsult, consultoria especializada no setor de grãos, também fez seus cálculos para a safra 2018/2019. Ela projeta que a produção de soja chega a 108 milhões de toneladas - contra os 80,9 milhões estimados pelo ministério. Pela Agroconsult, a colheita de milho também vai ultrapassar as 100 milhões de toneladas (praticamente o dobro da produção atual), número bem superior ao projetado pelo governo.

O que difere nas análises do ministério e da Agroconsult é o grau de otimismo. As conclusões do governo são mais conservadoras - e é até natural que sejam mesmo. Já a consultoria, com uma percepção mais de mercado, aposta num avanço mais agressivo.

O certo é que as duas apontam para um aumento forte na produção agrícola. Minha preocupação: se hoje não há logística (para ficar apenas nesse item) que dê suporte ao setor, o que será do escoamento da produção agrícola em 10 anos?

Monsanto entra no negócio da cana-de-açúcar

Apagada pela fusão histórica do Itaú com o Unibanco, hoje foi informada ao mercado a entrada da Monsanto na indústria da cana-de-açúcar com a aquisição de duas empresas relacionadas ao setor: Canavialis e Alellyx. Estas empresas pertenciam à Votorantim.

Abaixo segue a notícia na íntegra publicada pela Reuters:

Monsanto paga US$290 mi por pioneiras em biotecnologia no Brasil

SÃO PAULO (Reuters) - A norte-americana Monsanto, líder global em biotecnologia para a agricultura, anunciou nesta segunda-feira que pagará 290 milhões de dólares pelas operações das brasileiras Alellyx e CanaVialis, empresas do grupo Votorantim que atuam no desenvolvimento tecnológico de variedades agrícolas, com ênfase em cana-de-açúcar.

O negócio permitirá à multinacional a diversificação de seu portfólio agrícola e também, segundo a empresa, leva em conta o potencial da cana-de-açúcar para a produção de etanol.

"A demanda global por açúcar bruto e por biocombustíveis está começando a crescer em uma velocidade maior que os níveis atuais de produção de cana-de-açúcar, uma cultura essencial para atender essas demandas", disse o vice-presidente executivo de estratégia global da Monsanto, Carl Casale, em um comunicado.

A Alellyx, empresa que atua em desenvolvimento biotecnológico desde 2002, e a CanaVialis, que trabalha com melhorias de variedades de cana-de-açúcar desde 2003, já tinham acordos com a Monsanto, firmados em 2007, para o desenvolvimento de cana resistente ao herbicida glifosato (Roundup Ready) e ao ataque de insetos, com a tecnologia Bt.

"O expertise da Monsanto combinado com os conhecimentos da CanaVialis e Alellyx vão ajudar produtores a aumentar substancialmente a produtividade em um período mais curto de tempo", declarou o diretor-executivo da Votorantim Novos Negócios, Fernando Reinach.

A CanaVialis tem contratos com 46 usinas de cana no Brasil que produzem em uma área de 1,1 milhão de hectares.

Segundo a Monsanto, com o negócio a empresa tem o objetivo de aumentar a produtividade da cana, ao mesmo tempo em que reduz o volume de recursos necessários para o cultivo.

Quando os produtos melhorados geneticamente estiverem sendo utilizados, as empresas prevêem redução dos custos de produção nos canaviais, uma vez que vários agroquímicos deixarão de ser aplicados, tanto para o controle de ervas daninhas como para o controle de insetos.

A cana com tecnologia Bt seria resistente à broca (Diatraea saccharalis), um inseto cuja larva se alimenta da gramínea. Essa é uma das principais pragas da planta, que atualmente é combatida por meios químicos e biológicos. O mesmo gene poderia combater também a cigarrinha, outra "praga" da cultura, insetos esses que tendem a aumentar com a gradativa redução das queimadas da palha, com o avanço da colheita mecânica.

No caso da cana Roundup Ready, ela poderia ser bastante útil nas plantações que irão se desenvolver em áreas de pastagens degradadas. A cana resistente ao herbicida poderia ser eficiente em áreas que têm o capim-braquiária, de difícil combate atualmente. Hoje essa erva é retirada de plantações de cana por meio da capina ou por uma cuidadosa aplicação do herbicida.

A Alellyx é uma empresa pioneira na área de biotecnologia no Brasil. Ela foi fundada por um grupo de biólogos moleculares que haviam trabalhado no sequenciamento genético da bactéria Xylella fastidiosa, causadora da praga do amarelinho nos cítricos, bem como de outros organismos dentro de Projetos Genoma paulistas, brasileiros e internacionais.

(Texto de Roberto Samora; edição de Marcelo Teixeira)